Nos últimos anos a jovem pianista eslovena Kaja Draksler vem construindo um percurso sólido, afirmando-se como notável instrumentista e improvisadora. No disco “The Lives of Many Others”, registo de piano solo editado em 2013, Draksler revelava desde logo a sua amplitude expressiva: orientação jazzística com ligação à música clássica e à improvisação. A parceria com a trompetista portuense Susana Santos Silva, duo registado no disco “This Love” (2015), veio reforçar esta ideia de se tratar de uma pianista de horizontes largos.
Agora a eslovena abraça um ambicioso projecto orquestral. “Gledalec”, edição Clean Feed, é um disco duplo que parte da composição e arranjos de Draksler para criar uma música original que atravessa múltiplos universos. Por vezes entramos num puro registo operático, outras vezes ouve-se música de câmara cristalina, mas há também há momentos de improvisação suja, exploração e desafio.
A compositora Kaja Draksler lidera um octeto que junta os músicos: Björk Níelsdóttir e Laura Polence (vozes), Ada Rave (saxofone tenor e clarinete), Ab Baars (clarinete, saxofone tenor e flauta shakuhachi), George Dumitriu (violino e viola), Lennart Heyndels (contrabaixo) e Onno Govaert (bateria e percussão). A estes músicos cabe a responsabilidade de interpretar as composições com precisão, sendo ainda fundamentais no desenvolvimento dos momentos de improvisação aberta.
A música é complementada com poemas de Pablo Neruda, Andriana Minou e Gregor Strniša e, resultado desta mescla, há uma permanente tensão dramática. Desafiando convenções, a música do octeto atravessa universos sonoros sem medo do risco – num momento ouvem-se vozes cândidas em perfeita sincronia, no momento seguinte um saxofone ruge raivoso. Kaja Draksler já não é apenas uma excelente pianista e improvisadora, ao leme desta grandiosa empreitada confirma-se também compositora de exceção.