bodyspace.net


Black Bombaim & Peter Brötzmann Black Bombaim & Peter Brötzmann

2016
Shhpuma / Lovers & Lollypops


A colaboração já não deveria ser uma completa surpresa. Os Black Bombaim, trio oriundo de Barcelos, praticante de “stoner rock”, já havia colaborado com saxofonistas enérgicos, como Steve Mackay, Pedro Sousa e Rodrigo Amado (encontro registado na compilação 10 anos Bodyspace). Juntaram-se agora a um dos pais da improvisação europeia, Peter Brötzmann, figura tutelar da música sem rede desde que editou discos icónicos como “For Adolphe Sax”, “Machine Gun” e “Nipples. E mestre a cuspir fogo através do seu saxofone tenor.

O encontro deu-se em Fevereiro deste 2016: juntaram-se, ensaiaram na SMUP (Parede), actuaram no Festival Rescado (Culturgest, Lisboa), tocaram no dia seguinte no Hard Clube (Gaia) e gravaram nos Estúdios Sá da Bandeira (Porto). À formação base de Ricardo Miranda (guitarra eléctrica), Tojó Rodrigues (baixo eléctrico) e Paulo Gonçalves (bateria), juntou-se então o indomável sax tenor de Brötzmann.

O disco divide-se em cinco temas (o booklet assinala apenas quatro, e sem títulos, apenas “Part I”, Part II”, etc.). A música arranca com Brötzmann a solo, a uivar fervorosamente, até que entra finalmente o trio barcelense: rock assente em estrutura estável, guitarra, baixo e bateria, base rítmica segura sobre o qual o saxofone voa livremente. Nem sempre o rugido do saxofone, sempre a oscilar, consegue ligar automaticamente com o “groove” e o “fuzz” dos Black Bombaim. Contudo, cedo encontram pontos de contacto.

Sobre o concerto no Rescaldo, o Paulo Cecílio escreveu: “não obstante o poderio do trio de Barcelos, foram completamente ensombrados pela presença de Brötzmann, que se empoleirou nos ombros dos gigantes, arrancou com o seu sopro fortíssimo e não mais deixou de reluzir, até final”. Essa relação de forças reflecte-se também nesta gravação, onde é o saxofone que vai abrindo o caminho pela floresta negra sónica. O terceiro tema será porventura aquele onde os mundos se melhor se fundem. A cadência rítmica da banda encontra o ritmo de Brötzmann, levando os “riffs” a seguir no seu encalço.

A banda de Barcelos apresentou-se em mundo em 2009 e desde então vem construindo um sólido percurso, extrapolando fronteiras - geográficas e musicais. Este encontro com o velho Brötzmann não é apenas mais um degrau, é um verdadeiro cume, pico artístico dificilmente igualável. Psicadelismo com fogo dentro, avalanche sónica alimentada pelo saxofone como lança-chamas. Definitivamente, um encontro feliz.


Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
25/10/2016