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Tortoise The Catastrophist

2016
Thrill Jockey


Antes de avançarmos em detalhe pelo novo álbum dos Tortoise, fica uma nota prévia: a audição inaugural de The Catastrophist foi feita em trânsito, primeiro no metro, depois numa caminhada nocturna de cerca de meia hora. Chegado ao final da escuta e pouco depois ao destino, concluiu-se que o test drive ambulante não foi exactamente auspicioso. E as audições subsequentes, já em ambiente doméstico, mantiveram no pódio – um pódio coxo porque só dá para dois lugares – o par de saliências mais entusiasmantes detectadas logo à primeira.

São elas: “Yonder Blue”, uma belíssima canção de soul retorcida e guitarras distorcidas e com a voz (sim, a voz... oh, quanta infâmia!) de Georgia Hubley dos Yo La Tengo, e também “Rock On”, uma divertida reinterpretação do original dos 70s de David Essex e que não fica a dever nada à versão dos Def Leppard. Quer isto dizer que, ao sétimo disco, a banda de Chicago faz melhor figura quando abre espaço à presença de forasteiros, em carne ou em espírito.

A bem da justiça na hora do veredicto, importa referir que em “Gesceap” se acompanha com interesse um desacelerado combate, com os sintetizadores como espadachins. E que “Gopher Island” é um fetiche retro que, logo ao início, até faz lembrar aquele som de aspersor electrónico dos Suicide mas que depois se esbardalha e esgota rapidamente no minuto de duração que tem.

Em qualquer dos casos, isto é material que já fez jurisprudência na carreira da formação de John McEntire. E, por isso, equivalerá um pouco a um mito de Sísifo do pós-rock: bem podem os Tortoise tentar elevar a música, uma e outra vez, ao topo da montanha que ela acabará sempre por rolar por ali abaixo e não é certo que não fique com mossa a cada embate.

The Catastrophist não é enfim um disco para ficar de cara à banda – a capa sugere aliás movimento tectónico apenas ao nível da dentição. É até um trabalho bem medianinho por comparação com essa obra fundamental do pós-rock, Millions Now Living Will Never Die (1996), talvez a fase mais criativa da banda de Chicago (por coincidência, quando David Pajo andava por lá). Mas também não se pode pedir a uma formação com um quarto de século de actividade que edite sempre coisas boas. Digamos que, no espectro de qualidade, este novo disco fica algures entre o Millions... e o extraordinário flop que foi It’s All Around You (2004). Quando já se está a competir na segunda liga, é um bocado indiferente se ficamos a meio da tabela ou uns lugares mais acima ou mais abaixo.


Hélder Gomes
hefgomes@gmail.com
28/01/2016