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Micachu And The Shapes Good Sad Happy Bad

2015
Rough Trade


Sempre que nos cai ao colo uma artista como Mica Levi, tendemos a classificá-la como idiossincrática, isto é, alguém que escapa a toda a espécie de normas e cria um corpo de trabalho que, mais do que original - porque as influências são perceptíveis -, é distinto de tudo o resto. Já assim o era em Jewellery, álbum de pop estranha e inclassificável, mas o momento em que pensámos estar realmente perante alguém capaz de coisas estrondosas de tão fora que são foi em Chopped And Screwed, onde Micachu fez chocar DJ Screw e uma orquestra sinfónica, com o resultado genial que se conhece. "Fall" é ainda hoje um dos temas da década.

Ao terceiro disco com os The Shapes, Micachu continua amarrada a essa idiossincrasia. Eugene S. Robinson, dos Oxbow, é fã - e disse do disco que "não era twee de todo". É a descrição de Good Sad Happy Bad como twee que nos deixará confusos, mas faz sentido; há aqui uma doçura estranha que percorre estas treze faixas, quase como se do outro lado houvesse um Wayne Coyne gritando finally the twee poppers are taking acid. A doçura começa em "Sad", que é o que teria sido o pós-punk se feito num quarto e para a Internet, ritmo simplista e ruído electrónico.

Mas há mais. Há afinações bizarras, como em "Relaxing". Há o psych bamboleante de "Sea Air". E há "Waiting", "Unity" e "Peach" num disco que, não sendo o melhor que Micachu já fez, é coeso quanto baste para podermos continuar a chamar-lhe, enquanto elogio imenso, idiossincrática. É a resposta deste século às Shaggs, mas em melhor. Frank Zappa ficaria orgulhoso, Kurt Cobain usaria t-shirts suas, e duas dezenas de melómanos desajeitados cantariam as suas virtudes. Como tem que ser.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
21/12/2015