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OOIOO Gamel

2014
Thrill Jockey


É fácil arranjar um disco que venha a memória quando se ouve o sétimo álbum das OOIOO. Esse disco é “TNT”, dos Tortoise. O que é difícil é encontrar um disco parecido com ”Gamel”. E isto está muito longe de ser um qualquer paradoxo. Digamos que é da mesma forma que nos lembramos de riffs dos Black Sabbath quando ouvimos SunnO))). O que Yoshimi P-We (baterista/vocalista dos históricos Boredoms) e a sua banda fazem aqui é transplantar essas memórias do tempo em que o post-rock se confundia com Chicago, para um qualquer local de confluência massiva de culturas, loucura falsamente infantil, e carroceis de aceleração continua, iluminados por strobes de várias cores.

Boa parte das músicas de ”Gamel” nasce, precisamente, da percussão inspirada nas orquestras javenesas e balinesas de gamelan. Como qualquer lição de história e imagem se encontra facilmente no Google, direi apenas que o som é semelhante ao de pequeno/médios sinos a serem percutidos, acompanhados de metalofones. O disco, no entanto, está longe de se confinar a estes instrumentos. Temos cânticos onomatopeicos, guitarras Tortoise-com-açúcar, reprodução de melodias que parecem vindas de series de animação japonesas em fast-forward, palavras ou interjeições em japonês que se repetem a espaços irregulares, uma secção rítmica que nunca esquece de entrar em modo groove. E, acima de tudo, temos a estrutura das canções.

É a estrutura que dá o toque final de deliciosa confusão a ”Gamel”. Nao há canção que acabe como começou, nem com o meio igual ao princípio igual ao fim. As mutações estão sempre ao virar da esquina, fazendo de cada uma dessas canções uma viagem por uma selva onde os continentes se juntam. Exemplo? Ouçam as guitarras a imitar steel drums de “Gamel Uma Umo”. O tribalismo de “Gamel Ninna Yama”. Ou passem por “Kecupat Aneh” e vejam se não tem algo de afrobeat. Yoshimi e comparsas proporcionam-nos 59 minutos que nos deixam exaustos como torcer durante um jogo de futebol, cheio de momentos imprevisíveis. Mas em que no final saímos vitoriosos, com a correspondente elação. É fácil também imaginar toda a gente a pular em palco. E na assistência também.


Nuno Proença
nunoproenca@gmail.com
16/10/2014