Dividido em dois momentos, “White” e “Black” respectivamente, II (segundo disco dos polacos Innercity Ensemble) é uma espécie de estudo livre sobre o binómio branco-preto (ou tudo-nada, ordem-caos, paz-guerra, vida- morte, pureza- pecado, etc). A ideia não é propriamente original, mas a sua concretização orgânica e tão natural fá-lo ser diferente de todos os outros. Os Innercity Ensemble podiam ter escolhido o caminho mais fácil e fazer dois discos marcadamente diferentes, mas o que se houve aqui é uma viagem onde o branco dá progressivamente lugar ao negro tal como a noite dá lugar ao dia, jogando com todas as nuances coloridas no meio das duas cores.
Haverá mais, mas saltam à vista dois factores que permitem esta transição subtil e natural. Primeiro o diálogo, que permite que se ouça do jazz ao pós-rock, do krautrock à música ambiental sem atropelos ou confusões – ainda que com alguns bocejos pelo meio. Depois, o paciente e inteligente jogo com o espaço, que para lá da clareza, permite à música ganhar um corpo onde pode existir fisicamente.
Tudo começa com uma tábua rasa, num exercício fumarento e inquieto. Ao fundo ecoam sopros e ouvem-se percurssões espamódicas, numa espécie de preâmbulo da ordem. É quase sempre assim ao longo das cinco peças de “White”: caos à procura de ordem, peças a encaixar lentamente no seu lugar, sentimentos à procura de uma linguagem própria. Quando em “White 3” a criação encontra finalmente a ordem, abre-se espaço ao tribalismo e à electricidade, mas apenas brevemente. A transição entre os dois momentos começa pouco depois, de forma introspectiva e paciente, mas talvez porque o preto é a junção de todas as cores e talvez porque isso a faz ser a mais vibrante das cores, “Black” é totalmente celebratório. Há momentos em que apetece dançar (e há lá melhor lugar para dançar que no escuro?), um cuidado percussivo que contagia e dá rumo certeiro à viagem de criação e uma guitarra e trompete num diálogo verdadeiramente universal.
Se não servir para mais nada, que a serenidade com que II chega ao fim – imerso num longo e negro drone - fique como exemplo daqueles casos raros em que a compreensão, o respeito e a folia se equilibram ao ponto de serem quase mais notáveis que a música em si. Não que estes Innercity Ensemble e a sua música sejam maus – são ambos óptimos –, mas ainda melhor que isso é o diálogo constante, respeitador do espaço, do tempo e da expressão individual de cada um dos sete músicos, em claro benefício de um todo.