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Ought More Than Any Other Day

2014
Constellation Records


Fazia falta um disco assim em 2014 e tinha que vir do Canadá. Chama-se More Than Any Other e é um disco sentimental por vezes a roçar o choninhas, mas de tal forma humano como quem o ouve, que é relacionável desde o primeiro ao último segundo. Resta esperar que o mundo e a vida não façam das suas e o mantenham no mesmo sítio que ele canta: o dia-a-dia.

É verdade que este More Than Any Other Day não é só sentimento - e ainda bem -, e também não se pode dizer que os Ought tenham propriamente reinventado a roda. Há porrada também, e o seu apetite em partes iguais pela experiência e pela destruição soa muito reminescente de uns Sonic Youth - ou, em menor escala, dos Fucked Up. Mas também carregam os genes da família Constellation, por isso não é de admirar que no ao malharal sónico se deslinde um violino que está sempre lá, com propósito e discrição e nunca menos delicado (ou ruidoso) que uma guitarra.

Mas a voz de Beeler, a voz que carrega este disco às costas, é o elemento que traz mais emoção – e humanidade – para aqui. Soa cansada e gasta (porque é humana), mas também sempre preparadíssima e desafiante, como se estivesse em tumulto pessoal constante. Ouça-se este disco pelo bramido de “Gemini”, pelo grito consciente de “Today More Than Any Other Day” e encontrem-se assim portos seguros, onde não importa se soamos mais ou menos choninhas, mais ou menos zangados com o mundo, mais ou menos fartos de estar há tanto tempo debaixo deste céu carregado. Mas acima de tudo, para tropeçar na banalidade de uma frase que já todos pensámos, mas nunca escrevemos: “tell me what the weather’s like so I don’t have to go outside”.


António M. Silva
ant.matos.silva@gmail.com
22/05/2014