Dos Public Enemy aos Odd Future, dos N.W.A. aos Dälek, o hip-hop nunca se coibiu de, por vezes, seguir caminhos menos relacionados com a curtição e a fiesta e experimentar aquilo que a nós, servos do rock, mais puxa - adrenalina e caos, anarquia e abrasão, aquilo que os Hanatarash de Yamantaka Eye traduziam como NOISE, VIOLENCE, DESTROY, que existe na ondulação máxima de um riff ou no ácido de um verso mais puxado, uma sombra por detrás do nosso equivalente gosto pela pop e pelo sossego, bichinho que nos corrói o cérebro quando as coisas não andam bem e cada som é como um grito - power for power's sake, enfim. Os Death Grips, assim sendo, não escancararam porta nenhuma quando Exmilitary apareceu do nada em 2011 para nos arruinar (é um elogio) os ouvidos, assim como os clipping., formados por William Hutson, Jonathan Snipes (ex-Captain Ahab) e Daveed Diggs, não as destroçaram com este midcity, primeiro disco antes da sua estreia em 2014 pela Sub Pop.
É impossível - e ao ouvir percebe-se porquê - não fazer comparações com a banda de Zach Hill, apesar de serem coisas algo distintas; ao passo que os Death Grips se passeiam pelo rock (e em Exmilitary não tinham vergonha nenhuma de, por exemplo, pegar em Link Wray ou nos Pink Floyd) e fazem do estardalhaço e da destreza punk um enorme golpe publicitário, aquela atitude nonchalant de se estarem bem a cagar para o que pensem as pessoas que gostem deles ou não, os clipping. tomam outros caminhos, experimentando com o glitch e o noise, lembrando aos seus ouvintes que Merzbeat, do mais conhecido vegetariano japonês, é um disco influenciado pelo hip-hop, partindo do princípio que quem os ouve é ligeiramente mais inteligente e dado a sons estranhos que a multidão Pitchforkiana fã de MC Ride; nos clipping., e em midcity, parece existir a preocupação de realmente saltar fora da caixa em vez de juntar tudo numa amálgama de mescalina.
Os tópicos, esses, não variam, e o estilo vocal é semelhante (menos gritaria no caso dos clipping., mais rap do que punk), mas midcity soa-nos mais a uma reconstrução de um futuro distópico que a sua auto-destruição; os Death Grips, bomba prestes a rebentar, os clipping., aquilo que se segue mal o fumo se dissipa. Malhas para reter durante muito tempo: "loud", flow escorrendo entre metal electrónico, o gancho r&b de "bullshit" e o gancho rave de "guns.up" (que é muito provavelmente a melhor canção aqui presente) e a desconstrução total do hip-hop no "outro", dez minutos de Diggs a exclamar get money! em loop, ao mesmo tempo paródia e experimentação. Temos aqui uma banda para seguir com muita atenção; resta-nos esperar que, no ano que vem, a Sub Pop não os estrague como a Epic estragou sabemos-bem-quem. Para já é das coisas mais difíceis - e melhores - que se ouvirão este ano.