Apesar de algum entusiasmo recente em torno das particularidades redentoras da revisão pop à luz da uk garage – tanto pela via nostálgica deste artigo do Simon Reynolds ou como pelo digging da actualidade feito pelo Alex Macpherson neste artigo para a Fact – ou do perpetuar revitalizante desse legado naquilo que tem de mais vital pelas mãos de nomes como o DJ Q ou Nick Hannam, a verdade é que estamos ainda bastante longe da euforia generalizada aquando de Sincere, naquele momento em que os Artful Dodger eram gigantes e as rádios pirata se deixavam inundar por remixes não oficiais absolutamente fulcrais. Ainda assim, e descontando aqueles que se deixam levar pelo embuste de algo com o nome sofrível de future garage, é incontestável que a uk garage é hoje uma presença bem mais transversal do que há um par de anos atrás.
A remix dos Disclosure para “Running” da Jessie Ware é um dos exemplos perfeitos dessa mesma situação, chegando um pouco a todo o lado em Inglaterra. Alimentando um (relativo) buzz às custas de produções como “Flow” ou “Tenderly”, este muito jovem duo tem revelado argumentos sustentáveis para tal. Evitando que o falatório em seu redor se resuma ao facto de se tratarem de dois miúdos – 17 e 20 anos – em demonstrações potencial a pedir meças à futurologia. Não que os manos Lawrence tenham já em The Face uma linguagem marcada, tendo em conta que a sua idade revela uma maior reverência do que um conhecimento factual do clubbing, mas no articular das inflexões 2-step com a house mais elegante através de um denominador comum naquilo que têm de mais primário e/ou essencial – ouça-se “$tripper” de Bicep para perceber o brilhantismo de tudo isto – asseguraram já um lugar de respeito.
É por isso que, apesar da coerência interna, The Face revela ainda os Disclosure a descobrirem o seu trilho por entre os seus ídolos, sem grandes preocupações conjecturais e com uma noção precisa de aglutinação desses mesmos. E com boas canções : “Boiling” conta com a calor etéreo da voz de uma Sinéad Harnett algo genérica, mas capaz de conduzir os intrincados padrões rítmicos com segurança através de sintetizadores púrpura. O anonimato vocal que é utilizado como sample enquanto fio condutor em “What's in your Head” e “Lividup”, assumindo o four-on-the-floor de um modo mais incisivo por entre rendilhados de percussão, estalos de sintetizador e um entusiasmo elegante.
“Control” volta a creditar uma vocalista na pessoa da Ria Ritchie, submetendo-a às tácticas desse génio que é o Todd Edwards, sem se refugiar num pastiche devoto e assumindo descaradamente o ritmo 2-step, submergindo-o em cascatas de sintetizador que projectam toda a galvanização sensual da pista no seu estado mais apaziguador. Sem especular sobre passos vindouros, The Face assume os seus méritos sem quaisquer condescendência e com um poder de persuasão inescapável, num registo que como o Philip Sherburne salientou algures, habita o limbo entre o apelo da pop e um chamamento underground - prefiro entender isso não como um refúgio, mas como um habitat natural e permeável. Pegando nessa proposta como aquilo que há de melhor na uk garage – ou mesmo na música de dança em geral, esticando a corda - The Face ganha logo por se situar nesse pico de interesse.