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Frankie Rose Interstellar

2012
Slumberland


Para um “movimento” com uma existência tão efémera e – em última análise – inócua, os ecos do shoegazing fazem por perdurar, naquilo que teve de mais pernicioso, muito para além do que um legado tão pobre faria prever. Com efeito, para além dos My Bloody Valentine e dos dois primeiros álbuns dos Ride (deixando de fora os Jesus & Mary Chain e os Cocteau Twins enquanto progenitores), pouco houve de relevante na enxurrada de bandas nascidas em Ilhas Britânicas no período 89/91. Uma meia dúzia de boas canções a elevarem-se além da tacanhez mascarada de efeitos de uma ”scene that celebrates itself” que devia ter ficado por essa mesma premissa.

Sendo que Interstellar não descende tão directamente dos míudos tímidos de olhos fixados no chão - como que há procura das estrelas ou de maneiras para disfarçar a ausência de canções – como uns sofríveis Pains of Being Pure at Heart ou The Radio Dept., as coordenadas estão todas fixadas num contínuo temporal marcado pelo reverb que aparece em meados dos anos 80 e vai progredindo de modo sonolento até aos inícios de 90. E (quase) tudo em terras de Sua Majestade. O que vindo de uma rapariga que fez parte de Crystal Stilts, Vivian Girls e Dum Dum Girls faz todo o sentido enquanto promulgação do revival C86 nascido nos EUA. Talvez seja o distanciamento geográfico a ditar o fascínio por esse passado.

Abandonando o ruído dos primeiros singles e álbum de estreia, Interstellar faz por se afastar do fantasma dos Black Tambourine – banda seminal da Slumberland que desde logo olhou com interesse para aquilo que se vinha a passar do outro lado do Atlântico – ao mesmo tempo que delapida um som menos preso aos seus projectos anteriores. O que, ocasionalmente, até é uma boa opção e traz algum do charme dos Stereolab circa The Groop Played Space Age Bachelor Pad Music se eles levassem a tag New Wave a sério. “Interstellar” a deixar logo patente esta ideia, não fosse o reverb abusivo da bateria trazer todos os tiques das produções dos anos 80. Como o rendilhado da guitarra de “Know Me” que evoca todo o enjoo doce das Lush. E a ter réplica ao longo do disco.

É preciso chegar a “Gospel/Grace” para chegar à primeira boa canção de Interstellar. O riff reminiscente de “Ordinary World” dos Duran Duran sobre uma batida resgatada a Head on the Door a precederem a contenção das harmonias vocais que vão conduzindo o tema até uma primeira explosão. Até se dar uma pequena maravilha com a chegada de uns arranjos pseudo-orquestrais (não confundir com barroquismo balofo) que fazem de um tema simpático algo bastante mais interessante. De resto, e com excepção em “Had We Had It” (ou como o groop é sempre de respeito), “Apples For the Sun” (pianos vindos poço e a sombra da Kate Bush) e “The Fall” a encerrar com um desencanto adorável, pouco mais há a reter de Interstellar que não sejam uns arranjos mais inventivos do que o usual nestas coisas.

Acima de tudo, é um disco que sofre da pior das maleitas da “pop” indie, que é a ausência de verdadeiras canções e de tudo o que essa zona cinzenta entre o falso experimentalismo e a escrita emocional acarreta : o cabotinismo e uma visão ensimesmada da pop enquanto subterfúgio. Coisa que não é de hoje, e do qual Interstellar nem será o pior exemplo. Apenas um disco ligeiramente superior a muitas merdas que não vou ouvir. Arrogância? Chamemos-lhe antes falta de paciência para a mediania. 2/3 de Interstellar são feitos disso.


Bruno Silva
celasdeathsquad@gmail.com
27/02/2012