É do conhecimento geral que as zonas ligadas ao “indie” tĂŞm tido a praia como elemento fulcral do seu imaginário. A praia, a inocĂŞncia, a infância, o VerĂŁo, e coiso e tal. Agora, antes que toda essa imagĂ©tica de gajo que já devia mas Ă© ter crescido vos faça sentir mal, vamos a uma praia como deve ser. Uma sem nostalgias patetas, sem sintetizadores de loja dos 300, sem recordações das desgraças dos 80s, sem vozes de criancinha desmamada. Vamos ouvir “Bodies In The Dunes”, a quarta mĂşsica de “The Horror”. Deixemo-nos hipnotizar por aquele ritmo marcial, e repleto de percussões metálicas de Zach Ziemann, pela voz apocalĂptica de Chris Bug, pela guitarra que ora zumbe ora corrĂłi de Ivan Lip, pelo baixo há-algo-no-escuro de Pascal Ludet. É excitação, desvario, uma corrida de ”Monster Truck a esmagar ossos. É uma das grandes mĂşsicas que o mundo guitarrĂstico nos ofereceu recentemente.
Daqui em diante, neste texto, esqueçamos a teoria do espelho do parágrafo anterior. Iremos apenas falar de um disco que, com as devidas semelhanças aos Birthday Party (Lip tem muito em comum com Rowland S. Howard) , e a pedacinhos de Sonic Youth, Shellac, Girls Against Boys, The Jesus Lizard, tem tambĂ©m uma personalidade fortemente americana na sua agressividade e imaginário, o suficiente para se distinguir dos lendários australianos. “Burn The Worm” entra a matar, provocando sensações de acelerações desconcertantes em jogo de arcada, e desastres evitados inextremis quando ouvimos os impactos dos cĂmbalos no refrĂŁo. “New Electronix” Ă© punk filtrado por uma lente noise, e voz que grita mais do que canta, levando tudo Ă frente como uma parede de vento. Há letras, claro. Que nĂŁo sĂŁo nada do que nĂŁo pudĂ©ssemos imaginar ouvindo as mĂşsicas. “Two dogs fucking / Digging for gold” Ă© logo a primeira. “Nature Boy” chega a um refrĂŁo que apresenta um simulacro de groove, num misto de exercĂcio militar e dança macábra. “Hips to the right and hips to the left / Right Left / Right left” diz Chris Bug, parecendo saber que os seus comandados já sĂł respondem por temerem pela prĂłpria vida.
Muitas frases aqui sĂŁo ditas inĂşmeras vezes. Faz sentido, se pensarmos que “The Horror” tambĂ©m nĂŁo deixa os seus motorika-crĂ©ditos por mĂŁos alheias. Será isto no-wave-death-krautrock-pĂłs-hardcore? Podia ser, mas isso seria, porventura, complicado demais, por isso esqueçam que foi escrito. Passemos, por exemplo, para a parte, em “Hang Em High”, onde Chris Bug diz que alguns gritam para o fazermos “until he dies”. Ou na Ăşltima “Crime Time”, quando avisa “I might need someone to cut me off”, mesmo antes do tĂtulo da mĂşsica ser projectada e detonada no ar. SĂŁo, tal como praticamente todo o disco, momentos de intensidade no vermelho. “The Horror” Ă© 2012 a irromper pelo cimento, pelo vidro, pela madeira, por qualquer que seja o material. Os restantes meses levaram uma bofetada de luva negra repleta de picos em desafio!