O nome deste projecto paralelo do vocalista de Gaslight Anthem foi inspirado pelo poema inglês “Twa Corbies” – em que dois corvos discutem sobre a forma de consumir os restos mortais dum cavaleiro abandonado pela sua amada –, espécie de comentário sombrio sobre a vida, em que ou devoramos ou acabamos por ser devorados. E o álbum gira em redor de três relacionamentos amorosos que destroçaram Brian Fallon, inspirando-o a discorrer sobre a merda que são as relações humanas, especialmente as românticas. Acabam por ser essas memórias, a maior parte delas pouco agradáveis – à excepção da última faixa –, que povoam as músicas com fantasmas de mulheres, como quando canta «I carry each and every ghost of my lovers at once em “Go Tell Everybody”.
Tendo Brian Fallon como protagonista, Ă© quase inevitável entrar em comparações com a banda de Sink Or Swim. Mas aqui a combustĂŁo das melodias Ă© mais lenta e fumarenta, para ouvir no silĂŞncio das horas tardias, sem ruĂdo em redor. As raĂzes punk estĂŁo mais escondidas. E tambĂ©m nĂŁo existem tantos hinos Ă Boss (Ă© bom recordar que os Gaslight Anthem, oriundos de New Jersey, tĂŞm em Bruce Springsteen uma espĂ©cie de padrinho espiritual), daqueles que levantam estádios e corações. Se a veia elĂ©ctrica e enĂ©rgica de Gaslight Anthem pode sair vencedora dum festival ao ar livre, este projecto (entre o contemplativo e o melancĂłlico, quase sempre acĂşstico) pede mais uma sala que crie um ambiente Ăntimo, com maior proximidade entre a banda (Fallon gravou o álbum com o seu amigo Ian Perkins e mĂşsicos convidados) e o pĂşblico.
Fallon comprova os seus dotes de letrista (em vez de contar histĂłrias, aqui canta dores e desamores), compositor e vocalista, com iguais doses de talento e paixĂŁo, expondo as cicatrizes que em Gaslight Anthem estĂŁo tatuadas pela energia do rock. Existem algumas malhas intensas (a exemplo de “Behold The Hurricane”, com o coro elĂ©ctrico que ecoa por uma casa vazia) e outras que vĂŁo ganhando força – como “Mary Ann”, rasgada por berros e guitarras –, mas o tom geral Ă© outro. “Last Rites” lança a toada, com as vozes e o piano envoltos numa cortina de fumo e uma letra que fala de enterrar memĂłrias vivas; com “Sugar” balança-se ao sabor do desengano e “Black Betty & The Moon” esconde uma mensagem terrĂvel sob a inocente melodia.
Reza a histĂłria que, no concerto de estreia de Horrible Crowes, Brian Fallon agradeceu Ă s raparigas que lhe partiram o coração, aos respectivos namorados actuais e Ă s mĂŁes que criaram essas “mulheres horrĂveis” por o terem inspirado a escrever estas mĂşsicas. A vingança, afinal, tambĂ©m pode ser um prato criativo.