Que nos trouxe a chillwave que não seja memórias recicladas de um passado mal vivido? Que nos trouxe o género em si senão centenas de bandas de quarto, cada qual imitando a outra, poucas havendo que se consigam elevar acima dos seus pares e criar algo que se possa dizer aprazÃvel e de algum modo original? Que nos trouxe o nome do género, para além de uma salutar barrigada de riso, não tivesse o epÃteto nascido onde nasceu?
São questões pertinentes, e que em 2011 parecem ter estado nas cabeças de quem começou pela emulação e que, em novos trabalhos, se lançou na criação de algo que não pudesse ser facilmente rotulado a este género. Assim de repente lembramo-nos de Toro Y Moi, que em Underneath The Pine se virou para uma sonoridade mais funk, ou de Washed Out, que continua a criar synthpop mas que deixou de a mastigar como o fez em Life Of Leisure, há dois anos. É apenas natural, evidentemente, que um artista se queira reinventar com cada novo trabalho. Assim se cria a originalidade de que se falava. No caso destes dois, e juntando-se-lhe Neon Indian, o que temos são discos feitos a partir de coordenadas chillwave - isto é, anos 80, sintetizadores, lo-fi, a honra de ter um dia aprendido a mexer num VHS - mas que não respeitam as "regras do género", se é que as houve.
O que salta à vista, então, em Era Extraña é a produção - já não tanto "banda de quarto" como "banda de palco". O tempo de Psychic Chasms e do desleixo drogado de "Deadbeat Summer" já lá vai; Alan Palomo cresceu. Do romance teen de "Should Have Taken Acid With You" passamos para "Polish Girl", igualmente a melhor faixa desta Era Extraña: Do I still cross your mind?. Já não é música para nos perdermos em nostalgia ou nos preocuparmos com o futuro. Um estado de espÃrito que se auto-define em "Future Sick", quando traz à baila os Boards Of Canada na mesma medida em que não quer saber se os traz realmente. All strung out from all that staring at the future / Some new smile passes me and I follow it.
O novo disco de Neon Indian é um bom exemplo de como um artista se pode reinventar sem esquecer a fórmula que lhe conferiu alguma atenção; dos três artistas que se mencionaram, foi aquele que menos radicalizou a base chillwave, mas permitiu, de certa forma, a evolução deste estilo de sonoridade via uma produção mais virada para o orgulho pop e não para o certo desprezo que o lo-fi lhe confere. "The Blindside Kiss" é ainda uma regurgitação, mas vista pelo lado do rock n´roll. "Hex Girlfriend" e a trilogia "Heart" são retro-futuristas, mas é como se o fossem por gosto e não por imitação. "Halogen" é uma canção pop inchada e obviamente destinada a ser tocada em grandes palcos. O disco, esse, é uma era que já não nos é tão estranha quanto isso, virtude do poder magistral do retro, mas que continua a proporcionar surpresas e sonhos.