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Blac Koyote Blac Koyote

2011
PAD


Ao cuidado de expectativas várias: este é um admirável mundo novo, camada sobre camada, que vive de constantes alternâncias entre texturas, instrumentos, dialectos. O universo de Blac Koyote – injustamente aqui apreciado por palavras – é sensorial o quanto baste para nos levar daqui para outra parte. Que sítio é esse, não sabemos. Certo é que não há vez nenhuma como a primeira. Não a desperdicem.

Há um dado a reter assim que nos dedicamos à exploração deste novo território idealizado por José Alberto Gomes, nome do músico que dá vida a Blac Koyote, que é o da indefinição temporal, musicalmente falando, na forma de enquadrar acontecimentos, ou se quiserem, momentos. Bem vistas as coisas, “They Are Flying Low†(primeiro tema do LP) não só aparenta ser mais breve do que na realidade é, como se poderia facilmente prestar a uma dissertação de vários andamentos, com intervenientes distintos ao longo de toda essa hipotética epopeia. Tudo isto com a síntese analógica facilmente manobrada por JAG a servir de pano de fundo, mas em que instrumentos acústicos assumem o controlo das minudências, do fino detalhe que dá relevo ao quadro. Esta sonoridade é, acima de tudo, musicalmente visual.

À terceira faixa do registo debutante de blac koyote deparamo-nos com uma atmosfera bem mais obscura, ritmada e estranhamente vocalizada. Esta é outra vertente do quadro já bem complexo que vínhamos conhecendo, mas que acaba por não destoar do restante alinhamento, tal é o cuidado em manter os astros alinhados. Com “Lula†surgem as cítaras, coordenadas sobre baixos em reverse, revelando detalhes rítmicos dignos do património de Jon Hopkins.

Há, por último, uma certa dose drone que não devemos excluir. Na medida certa, acrescentamos. Isto porque Blac Koyote é sinónimo de encadeamento de momentos distintos numa lógica comum. Assim o fez, eficazmente, no primeiro registo de longa duração que agora conhecemos. A continuar assim, estamos perante uma das singularidades mais notáveis que a música nacional nos tem dado a conhecer. Não é uma rapariga loira, mas antes um Koyote que faz da sua solidão um acontecimento que não deve ser esquecido.


Simão Martins
simaopmartins@gmail.com
10/11/2011