Se Kurt Vile um dia acordasse e, coisas parvas do existencialismo, duvidasse por um segundo que o que anda a fazer faz sentido (para ele ou para os outros), bastaria certamente ouvir "Baby's Arms" uma única vez para perceber que o caminho faz-se a andar para a frente e prosseguir o seu trajecto. É que convenhamos: basta a faixa de abertura de Smoke Ring For My Halo, cheia de vozes e partÃculas de memórias mais profundas, bela, estupidamente bela, para perceber que aqui há gato: Kurt Vile sabe escrever canções e até ele sabe disso. Como aquela mulher que, sabendo-se bonita, caminha pela rua com profundo conhecimento de si mesma.
Smoke Ring For My Halo está, no entanto, muito longe de se esgotar na sua primeira canção. Ora baladeiro, ora mais rockeiro, é uma viagem sossegada mas recompensadora pelo folk-rock de medidas certinhas. Menos lo fi e mais directo que os seus antecessores, Smoke Ring For My Halo tem belÃssimas canções a cada esquina: "On Tour" arrasta-se calmamente na sua beleza sem ir a lado algum (elogio), enquanto que a desarmante "Peeping Tomboy", perfeita auto-suficiência da voz e da guitarra, levanta voo sem sair do sÃtio para espalhar magia (é, ao lado de "Baby´s Arms", a melhor canção do disco).
"Runner Ups" e "Ghost Town", belÃssimas, são canções que já nem se usam. E ainda bem. Kurt Vile é mestre em ir ao passado e, acrescentando-lhe a sua visão bastante própria, contar de novo a história. Sem grandes pretensões de inventar um mundo novo ou dar uma nova vida à s 7 vidas da música folk. Kurt Vile anda a escrever grandes canções: é preciso que o mundo saiba disso. Abençoada melancolia.