Ocasionalmente é necessário regressar à s raÃzes para se redescobrir a essência. E regressar à s raÃzes da house, actualmente, nem significa ter de abrir o baú das velhas glórias de finais de 80 ou inÃcios de 90 e recordar alegrias até ao escorrer da primeira lágrima nostálgica. Dos poucos que ainda têm bem presentes na memoria a sensação de descoberta de novos mundos, espera-se sempre um sentido de oportunidade que, simultaneamente, nos recorde da magia de outros tempos e nos proporcione novos desafios. O processo de diluição dos dois nem sempre está ao dispor de quem quer, mas sim de quem sabe. E Big Strick sabe. Raramente se dedicou á produção nestes últimos 25 anos, mas como DJ (tornado experiente) foi cravando na sua pedra da vivência o prazer que lhe deu o vibe inicial de toda a cena house-music e techno.
A velha – mas claramente não datada – instrumentação analógica continua a fazer sentido para o norte-americano Leonard Strickland, para os amigos Big Strick. “Strickly analogue baby!!! I have some computer software but to me it just doesn’t sound the same. Not phatt enoughâ€. Disse-o numa entrevista algures. Permitindo a extrapolação, depreende-se que o impacto do som produzido pela velha “artilharia†é único na hora de sentir a música. Ouvindo Detroit Heat isso não passa despercebido. Mesmo com imperfeições, Detroit Heat está num nÃvel empático superior. As distorções fazem parte da equação, mesmo que estejam lá por mero acaso. Detroit Heat não é um álbum conceptual, longe disso. Big Strick não pensa a música como os seus conterrâneos Theo Parish, Moddymann, Rick Wilhite ou Marcellus Pittman. Nem sequer se tenta nivelar com a jovem mente criativa que é Kyle Hall. E independentemente do que se vai produzindo actualmente, é lhe indiferente a conjectura que promove o hype.
Big Strick, empurrado pelo primo Omar S, estreia-se assim como um quarentão, com a vida pessoal e familiar aparentemente orientada, interessado em produzir um tipo de deep house que, desde DJ adolescente, sempre o fascinou. É esse o capÃtulo final que temos em mãos: diamante puro, duro, ligeiramente cinzelado em nome de uma essência há muito perdida nos vÃcios do mercado, consciente de uma herança musical. Não há perfeição aqui, nem sequer um genuÃno facto estético no alinhamento. O que há é música em bruto, esculpida coerentemente – com amor, muito amor – a escopro e a martelo por um homem que recorda os pioneiros da soul, do funk, do techno da sua natal e velho espÃrito house de Chicago e que quer ser feliz na procura do vernáculo próprio, um vibe legÃtimo. Detroit Heat escalda para amantes do house verdadeiro. Um house a que poucos, neste momento, sabem dar valor.