Senhores/a de um som já há muito (alguns poderĂŁo argumentar desde sempre) institucionalizado, sĂşmula, tantas vezes perfeita, de uma combustĂŁo mental derivada das mais variadas drogas nos meandros do rock, Ă© forçoso reconhecer um terminante verdade (ou elegante ironia) aos Bardo Pond em baptizar este seu primeiro lançamento na mĂtica Fire Records simplesmente de Bardo Pond. Donos de um culto considerável, que açambarca na sua nĂ©voa as mais variadas gentes com o mĂnimo interesse no psicadelismo, o combo de FiladĂ©lfia faz bandeira de uma sonoridade reconhecĂvel que nunca procurou a reinvenção.
Os diamantes em bruto Bufo Alvarius foram sendo lapidados sem uma lĂłgica temporal estrita ao longo destes quase 20 anos, com Lapsed a amenizar de modo mais cancioneiro o brilhantismo fractal de Amanita, mas as viagem cĂłsmica atĂ© Ticket Crystals (entre álbuns e edições menores, num hit and miss constante) nunca mapeou um ponto de chegada. Claro que se pode sempre procurar argumentar, com recurso Ă s miudezas que fazem de On the Ellipse um disco mais interessante do que Dilate ou vice-versa, mas existe uma curiosa verdade em ser impossĂvel enunciar O DISCO de Bardo Pond por entre os “fĂŁs”. Um valor acrescido que Ă© mostra de um carinho, pouco habitual nos tempos que correm, perante uma banda tĂŁo Ăłbvia quanto continuamente interessante.
Bardo Pond nĂŁo vem mudar em nada esta situação. E muito dificilmente ficará para a histĂłria como um dos álbuns maiores do (recente) sexteto dos manos Gibbons. Repisam-se os mesmos calos, exultam-se as mesmas virtudes de sempre. Desta feita, o mal maior está encerrado na pretensĂŁo Ă©pica dos 21 minutos de “Undone”, que passa tanto tempo a mastigar o mesmo motivo melĂłdico que quando chega a esperada explosĂŁo, esta atinge-nos com a força de um overdrive digital. O torpor que contrasta com punch directo de “Don't Know About You”, ainda assim incapaz de atingir a força anĂmica de malhas passadas como “Straw Dog”, naquele jeito desencantado de Isobel Sollenberger de cavalgar o riff.
É este Ăşltimo recurso que faz da tensĂŁo do baixo de Clint Takeda o fio condutor para as guitarras de “Cracker Wrist” se irem adensando em distorção antes de colapsarem num melter imponente. É aqui, e nas aproximações Ă folk que tĂŞm vindo a ser evidenciadas de modo mais contundente a partir de Dilate que residem os melhores momentos de Bardo Pond: “Just Once” abre o álbum numa aparente irresolução a la “Aphasia” antes da cascata de distorção conferir significado a “Tudo o que Sobe Tem de Convergir” enquanto “Wayne`s Tune” deixa-se pairar nessa aura com recurso ao bottleneck e Ă flauta para encerrar o pĂ©riplo de modo descontraĂdo. Pelo meio, “Sleeping” faz jus ao seu nome, num mantra plácido que nunca se encerra.
Momentos de uma maior delicadeza, que sugerem beleza sem a impor, e num contĂnuo com coisas como “Isle” ou “Tommy Gun Angel” se revelam aqui na melancolia estelar de “The Stars Behind” revestidas de uma fina melancolia. Sem deslumbrar. Que Ă©, contas feitas, o efeito de um disco tĂŁo eficaz quanto o previsto, numa banda cuja formação se mantĂ©m intacta desde os seus primĂłrdios. Fundações sĂłlidas para que se trate Bardo Pond com o carinho que merece. É fodido ser mesquinho para alguĂ©m tĂŁo disposto a nunca desiludir. Como uma amizade que se quer preservar.