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Tindersticks Waiting for the Moon

2003
Beggars Banquet Records


Depois de nos Ășltimos dois discos terem desbravado campos de notas musicais onde a soul se assumia como grande novidade, os Tindersitcks parecem ter voltado aos violinos, ao declamar de versos feitos de relaçÔes desfeitas e ao manto cinzento que paira sobre personagens urbanos envolvidos pelo fumo dos cigarros, dias que custam a passar e noites solitĂĄrias sem o mĂ­nimo esguicho de encanto.

Com os dois primeiros discos os Tindersticks ficaram, irremediavelmente, ligados a uma ideia de canção dolorosa, cinzenta e acompanhada por uma voz que parecia arrastar-se ao ritmo da desilusĂŁo, encharcada com ĂĄlcool e asfixiada em cigarros. DaĂ­ atĂ© se tornarem numa banda de culto foi um ĂĄpice. “Curtains” completava uma espĂ©cie de trilogia da canção desgostosa e amargurada pelos falhanços amorosos, mas adoptando uma sonoridade mais limpa e audĂ­vel. Talvez por isso tenha servido para Stuart Staples e companhia como catapulta para um sucesso que, atĂ© aĂ­, se adivinhava difĂ­cil, pelo menos nas proporçÔes que viria a atingir. Nos tempos que se seguiram a banda de Notthingham denotou algum cansaço, quase como se tivessem explorado atĂ© aos limites a sua sonoridade. Adivinhava-se uma mudança. Em “Simple Pleasure” e “Can our love” as incursĂ”es na soul e a exploração dos teclados e das linhas de baixo assumiram-se como as principais estruturas das cançÔes. Os resultados finais foram discos com alguns dos melhores temas que conseguiram compor mas, e por outro lado, com um todo algo desfasado de coerĂȘncia musical. Quase que podemos dizer que os Tindersticks pareciam andar Ă  deriva, procurando coisas novas, alegres e coloridas a tudo o custo e numa tentativa (frustrada) de se afastarem da sua verdadeira essĂȘncia. Ou seja, composiçÔes intimas, com fortes cargas emocionais e interpretadas com o coração nas mĂŁos.

“Waiting for the moon” marca o encontro dos Tindersticks com essa forma de fazer cançÔes. Os violinos acordaram e a voz de Staples voltou a irromper pela noite quebrando o silĂȘncio melancĂłlico em que havia caĂ­do. Do primeiro ao Ășltimo tema este Ă© um disco com sentido, equilibrado e que, por certo, nos farĂĄ querer voltar a ouvir temas que pareciam ter ficado esquecidos na gaveta.

“my oblivion”, “trying to find a home” ou “say goodbye to the city” sĂŁo mergulhos em ĂĄguas profundas e frias, que nos ajudam a refrescar as ideias e os pensamentos para, de seguida, nos deixaram tranquilos e a boiar ao sabor da corrente sem grandes preocupaçÔes. No fim, nada-se para terra e corre-se com “running wild” nos ouvidos, numa sensação de libertação como hĂĄ muito nĂŁo se ouvia. E como sabe bem ser livre.


Jorge Baldaia
02/07/2003