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Azevedo Silva Carrossel

2010


Se a quantidade quisesse dizer alguma coisa, o cantor-compositor Luís Azevedo Silva seria um notável exemplo de produção musical. Com uma média de um disco por ano, dúzias de canções e concertos por todo o país (e não só), Azevedo Silva tem mantido uma interessante actividade. As suas edições discográficas são ainda representativas de uma impecável regularidade: Clarabóia (2006), Tartaruga (2007), Autista (2008) e Ao Vivo na Sociedade (2009) são reflexo de uma sistemática evolução. Contudo, não se trata apenas de quantidade e regularidade, Azevedo tem vindo a revelar-se um interessante contador de histórias - histórias tristes - em forma de canção.

Chega agora um novo disco, Carrossel, sete canções que foram alvo de uma aprimorada produção, contando com convidados como You Can't Win, Charlie Brown, Gaza (If Lucy Fell, Men Eater), Filipe Paszkiewicz e Filipe Grácio. Sem grandes novidades ao nível da forma, as canções do novo disco continuam a abordar as mesmas temáticas, sempre em português, e as músicas mantém uma permanente toada sombria. Um disco que arranque com a frase “depois do inverno volto a sentir que o mundo inteiro está p'ra ruir†pode não ser o objecto mais feliz, solarengo ou optimista que já se ouviu. Mas o mundo precisa também de quem cante os dias de chuva e Azevedo conta-nos histórias que nos fazem pensar.

Além das dúvidas pessoais/existenciais, há uma bem-vinda faceta política/intervenção, especialmente evidente no penúltimo tema, “A democracia será vingada no Rossioâ€, que foca o tema da precaridade. O último tema do disco/EP é uma resposta à “Canção da Canção Triste†dos Foge Foge Bandido de Manel Cruz, conseguindo o objectivo de ser uma canção ser ainda mais triste do que a própria “Canção da Canção Tristeâ€. A característica principal desta edição será a qualidade dos arranjos, tendo vários pormenores instrumentais a colorir cada canção, inteligentemente integrados com subtileza. A imprensa brasileira terá referido, a propósito de Azevedo, o termo “fado indieâ€. Vista de fora, esta expressão até pode fazer algum sentido, dada a constante toada melancólica, depressiva, negra. Por estes dias fará cada vez mais sentido termos à mão quem nos cante os dias sem sol.


Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
03/12/2010