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The Mattson 2 Feeling Hands

2010
Rush! Production / AWDR/LR2


Existe um mundo a descobrir quando se fala de westcoast e album oriented rock (AOR), mesmo que esses não sejam géneros habituais nos separadores das lojas de discos. O culto online é contudo facilmente constatável pelo seu fervor e uma breve pesquisa de Google abre horizontes aparentemente intermináveis – isto porque, no soft rock típico da costa oeste americana (aqui um feeling e nem tanto um território), os discos mais desejados são quase sempre os mais obscuros e o Graal é aquele single que só tocava numa rádio AM a horas impróprias. Este será um daqueles géneros que pertence mais aos esquecidos do que aos consagrados. Podíamos (ou não) falar de Bill LaBounty, Paul Davis, Marc Jordan, ou então entender a westcoast como um tecto abrangente para discos que descrevem sensações tempestivas com um rock de guitarras brando, ao mesmo tempo que camuflam a ruína emocional do homem com um cenário paradisíaco de praia (ou estrada) na capa. São discos feitos de tópicos de bolso para balcões cheios de falhados e merecem claramente ser desenterrados.

O mercado de discos no Japão parece entender o valor da westcoast e insiste em celebrar a América refundida com vistosas reedições que fazem babar os aficionados. Não admira, pois, que o novo disco dos Mattson 2 chegue primeiro ao Japão, num lançamento da Rush! Productions (um mês antes da Galaxia Records fazer o mesmo), que é cada vez mais assumida no seu gosto pelos sons da Califórnia. Não se julgue, mesmo assim, que Feeling Hands, o álbum de estreia dos Mattson 2, dá tempo de antena aos desabafos do homem assombrado por mulheres de sonho, que tantas vezes davam o mote para discos da westcoast. Feeling Hands não carrega de facto essa amargura, mas, de resto, é tão estupidamente californiano quanto a canção mais célebre de David Lee Roth: lá está a coolness, o surf-rock, as guitarras como brisa, o bichinho jazzy e a dose exacta de foleiro (principalmente nas guitarras que lembram Santana vintage). O cocktail musical dos Mattson 2 puxa a vontade de apreciá-lo com um cocktail real a caminho dos lábios por uma palhinha.

Os dois gémeos Mattson (Jared e Jonathan) sabem erguer uma canção, isso é certo, e conquistam pela forma como oscilam entre o elegante e o foleiro de modo aparentemente ingénuo (próprio da pop de cinquenta e sessenta). A mistura de John McEntire, dos Sea and Cake, no primeiro mini-álbum (Introducing the Mattson 2) traz também alguma lógica ao cheirinho da Chicago lofty e elegante que por aqui se escuta, mas a explicação do foleiro permanece um mistério e isso atribui muito charme a Feeling Hands. No fundo, os Mattson 2 compõem música de sedução para quando Bob encontra Charlotte, num lounge a meia-luz, antes de recolherem ao quarto para umas cambalhotas, que só aconteceram na imaginação de quem viu Lost in Translation. O gosto musical do Japão é um lugar estranho, mas perfeitamente acolhedor, neste caso.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
26/11/2010