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Former Ghosts New Love

2010
Upset the Rhythm


Nem que seja para contrariar todo a descontracção dos discos recentes com uma palmeira na capa, haverá sempre quem descubra um prazer profundo no compromisso de ser o único desgraçado numa festa cheia de gente feliz. É complicado perceber hoje quem faz o quê, na dimensão da pop que deriva principalmente da sua fricção com Ariel Pink e Animal Collective, mas, depois de tanta música inspirada pela praia, surgem inevitavelmente uns quantos tristes que preferem situar os ânimos na morgue.

Como se aproveitasse o conceito d’Os Mercenários - o elenco faz o filme -, a formação dos Former Ghosts reúne três tristes incuráveis - Freddy “This Song is a Mess but so am I†Ruppert, Jamie “Xiu Xiu†Stewart e Nika Roza Danilova, que responde também por Zola Jesus – para novas missões feitas de melodias mortas-vivas e sintetizadores com temperaturas abaixo de zero. O título do segundo álbum, New Love, procura fazer passar a ideia de renovação, apesar de nada ser particularmente inédito.

A surpresa, que devia ficar para o fim, será a participação de Yasmine Kittles, dos Tearist, no sussurro sexual de “I Am Not What You Wantâ€. Sussurro esse que torna clara a visão improvável de uma Chan Marshall (Cat Power) a andar de gatas no escuro de um filme maldoso de Lars Von Trier. As vozes de Yasmine Kittles e Chan Marshall chegam a ser tão semelhantes, neste fundo de poço, que um fã de You Are Free passa a alimentar a fantasia de um dia ter existido um disco chamado You Are Caged.

O principal compositor dos Former Ghosts, Freddy Ruppert, sim, continua aprisionado na parasitação desmedida dos Joy Division (ainda hoje tão imitados como em 1979), sendo que, desta vez, as canções não parecem tanto auto-paródias de pós-punk. New Love está mais disco: os Former Ghosts limaram algumas das arestas, que tornavam tosco e patético o debute Fleurs, e parecem agora encontrados com as canções. O mais estranho nisto tudo é que os experientes Freddy Ruppert e Jamie Stewart continuem a depender do pontual brilhantismo da novata Zola Jesus (e de Yasmine Kittles) para que o barco do desamor não se afunde. Mas todos tomam certamente a mesma medicação e é nessa cumplicidade moderna que reside a beleza de New Love.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
12/10/2010