Seu Jorge regressa, após América Brasil, um dos seus álbuns mais “farofeiros”, com um registo que tem mais groove nas veias do que samba no pé, mais electricidade do que batucada. Daà que a imagética do diamante psicadélico presente na capa do álbum não seja de todo inusitada. Nem o facto de o álbum ser editado pela americana Now-Again Records, vocacionada para sonoridades soul e funk.
Esta mudança sonora nem é de estranhar, pois este brasileiro cosmopolita faz-se acompanhar da Banda Almaz que, além do baixista António Pinto, integra Pupillo (bateria) e Lúcio Maia (guitarra), da Nação Zumbi, banda seminal criada por Chico Science e expoente maior do Manguebeat.
Mais de metade das mĂşsicas aqui presentes sĂŁo covers de outros respeitáveis artistas – “Rock With You”, de Michael Jackson, Ă© apresentada em toada de funk lento, sensual e lânguido; “Cristina”, de Tim Maia, surge como nova ode feminina, apĂłs dedicatĂłrias a Carolina e Ă Mina do CondomĂnio, por exemplo. Tal nĂŁo deverá acarretar qualquer espĂ©cie de preconceito, pois Seu Jorge Ă© responsável por algumas das mais belas versões dos Ăşltimos anos, nĂŁo sĂł nos álbuns em nome prĂłprio como, principalmente, na banda sonora de The Life Aquatic. Nesta pelĂcula do realizador Wes Anderson, a personagem desempenhada por Seu Jorge (PelĂ© dos Santos) interpreta em portuguĂŞs mĂşsicas originais de David Bowie, tais como “Rebel Rebel” ou “Life on Mars”, duma forma que chega a roçar o sublime. O problema Ă© que em Seu Jorge And Almaz se encontra muita competĂŞncia nestas interpretações, mas raramente o resultado final chega a impressionar pela sua originalidade ou pela alma nelas depositada. Oiça-se “Everybody Loves The Sunshine” (tema clássico de Roy Ayers), que decerto vai gozar de bastante airplay, seja nas rádios como em qualquer soalheira esplanada, para perceber a ideia.
Seu Jorge já disse, numa entrevista, que neste álbum tentou por vezes fazer ocean music, procurando transmitir a vibração da praia e do oceano. E é isto que está, de facto, presente em várias composições, em que se exploram sonoridades que remetem para esses ambientes, seja através das clássicas guitarras da surf music (oiçam-se, por exemplo, “Saudosa Bahia” ou “Das Model”) ou da própria temática – a hipnótica “Cirandar” é uma ode ao mar e um pedido de protecção para os pescadores.
Já o psicadelismo, por seu lado, encontra-se bem patente no solo de guitarra e nos refrões de “Pai João”, na letra de “Errare Humanum Est” e em “Girl You Move Me”.
“JuĂzo Final” (que Ă© quanto a mim a melhor mĂşsica do álbum e, tambĂ©m, a sĂşmula de influĂŞncias e sonoridades presentes neste trabalho, que vĂŁo do samba ao psicadelismo): saĂşda-se a vontade de renovação, mas faltará – tanto Ă s versões como Ă s composições originais – aquele desejável golpe de gĂ©nio, o grĂŁo na asa que fizesse Seu Jorge e restante tripulação levantar voo, num cintilante O.V.N.I. em forma de diamante, rumo a outras galáxias.