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Thomas Ankersmit Live In Utrecht

2010
Ash International


A capa pode levar ao engano: uma foto granulada de uma paisagem marítima coberta por um céu imenso, um lettering sóbrio. Pensamos logo que estamos perante mais uma inútil descarga de jazz pasmacento ECM. Não é o caso mas, apesar de tudo, a referência visual à editora alemã pode fazer algum sentido, uma vez que é na label de Manfred Eicher que encontramos os discos do Electro-Acoustic Ensemble de Evan Parker, onde se localizam óbvias afinidades com este som.

Com uma ligação próxima ao compositor minimalista Phill Niblock, o holandês Thomas Ankersmit elabora as suas explorações sonoras utilizando como ferramentas o saxofone alto e electrónica (laptop e sintetizador modular). Apesar de incluir no currículo colaborações com gente obrigatória/genial como Tony Conrad, Jim O'Rourke, Kevin Drumm ou Borbetomagus, este disco gravado ao vivo é o primeiro volume da sua discografia, uma estreia que acontece aos 30 anos.

Ao longo de uma faixa única de quase quarenta minutos, Ankersmit manipula electronicamente o som, a sonoridade do saxofone fica por vezes escondida, imersa na electricidade, outras vezes está mais saliente, por vezes simplesmente ausente, irreconhecível. Há momentos em que se ouve apenas um ligeiro fio de electricidade suspenso no ar, como burburinho de robots durante um coffee-break, para depois eclodir o som contínuo do saxofone, numa morosa implosão.

Voltemos ao inicio: não tanto pela exploração sónica do instrumento - será preciso comer muita sopinha para alguém se aproximar da mestria instrumental de Evan Parker - vale a pena evocar o trabalho do seu Electro-Acoustic Ensemble (actuação intensa no recente Jazz em Agosto) para enquadrar este registo, que tem como uma das suas principais qualidades o absoluto controlo do espaço sonoro, que vai ganhando corpo com uma lenta maleabilidade.


Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
28/09/2010