Contrariando uma lógica que costuma assomar frequentemente na imprensa musical portuguesa, toda a gente reparou nas letras dos temas de Keep on Your Mean Side (claro, porque são de forte dimensão sexual). Mas a relação de VV (a menina) com Hotel (o rapaz) começou por andar longe dessa componente. Ela era norte-americana, ele era inglês, e entre eles um oceano tinha o efeito intercessor, e as dependências musicais davam-se com trocas de cassetes e gravações de vozes por telefone. Uma primeira explicação para a música rude dos Kills poderá ser entendida aÃ: uma perseverança de um som que surge à distância, com poucos meios, assimilado em gravadores de 4 ou 8 pistas, para dar o ar pouco preciso de rebeldes-não-rebeldes que os tem caracterizado e que quase todos não têm poupado aos maiores elogios.
Depois do distanciamento, veio o isolamento. Fecharam-se numa cave, basearam-se no essencial e começaram a aperfeiçoar as canções que haviam trabalhado à distância, ou começaram a escrever outras. Tudo se foi passando depressa. Lançam um EP (“The Black Rooster EP), e fazem digressões juntamente com as Le Tigre e com os Primal Scream. De tudo isto à projecção internacional foi um pequeno passo, e não é de estranhar que tenham sido destaque em toda a imprensa especializada e apontados como a next big thing, sem ninguém se importar se por apenas três minutos. E, nesse campo, quase todos acertaram: isso aqui não passa de uma minuciosidade sem importância maior, é que este álbum já não sai da prateleira de quem o agarrou.
Evidenciando uma profunda admiração por um certo punk-blues que faz lembrar Velvet Underground e Patti Smith (sem ter necessariamente de estar muito próximo daqueles universos), a música dos The Kills é feita, em traços muito gerais, de intensidade, escuridão, perigo, densidade e aquela componente sexual. Uma música rude, que não se desdobra em meias palavras e vai directa ao assunto, proveniente de um lado do rock mais obscuro e até poético. Apresentam uma identidade que ninguém lhes pode negar como própria e é visÃvel um prazer na exploração do registo falado, que não anda longe do designado spoken-word embora não o chegue a ser completamente.
São invejosos, mas gostam partilhar aquilo que fazem. Não ligam muito à s outras pessoas, nem precisam. Complementam-se mutuamente, numa relação de dependência fÃsica e emocional que lhes permite abstrair daquilo que se passa em seu redor. “São perigo, não confortoâ€, são emoção, não razão, são egoÃstas, não altruÃstas. São interessantes, mas podiam ser mais.
“I haven’t fucked the past but I’ve fucked plenty with the future. On my breasts are scars from the splinters of stages and walls I’ve caressed.†declamava Patti Smith em â€Babelogue†em 1978. Sem ter a mesma carga emocional que preenchia as músicas dos idos de 70 da deusa maldita do rock, os Kills apareceram com vontade de querer voltar à queles tempos. E quando cantam, como em Keep On Your Mean Side, “Hey, fuck the peopleâ€, fica tudo esclarecido.