Se nas áreas sobrelotadas deste planeta a gravidade parece atrair todos na mesma direcção, há quem tenha como ponto de partida da acção criativa o extremo do sistema solar. O destino é provavelmente as profundezas do espaço. Essa extensão indefinida e inexplorada onde a imaginação vagueia sem constrangimentos ou frustrações, muitas vezes apenas embaraçada pela largueza do universo. Lugar não falta para as mais dispares divagações sonoras que a humanidade criou em nome do prazer.
Consciente dessa liberdade incessante, o produtor e baterista Nick Woodmansey solta-se pela primeira vez no cosmos em demanda pela pura poesia sonora aproveitando para consumo do seu veiculo espacial todas as poeiras ricas em excentricidades deixadas por Sun Ra. Absorvendo o essencial do legado mĂstico do mestre, este Emanative – com especial apreço pelo clarinete baixo – solta impressões e comoções sem pretenciosismos abstractos, criando ambientes melancĂłlicos onde o jazz, o hip-hop, o brokenbeat, a electrĂłnica e a soul vĂŁo erguendo uma eficiente verve melĂłdica que conduz o espĂrito atĂ© ao pulsar mais luminoso da pop contemporânea.
E se o apurado design da modernidade dos Two Banks of Four ou dos 4Hero tambĂ©m se faz sentir neste quadrante da galáxia, talvez seja na subtileza das opções estĂ©ticas que Emanative se faz compreender. É com o aprumo nos arranjos, no empenhamento dos seus convidados, no cuidado da produção que tambĂ©m se aprecia a força vital que enriquece Space no seu conjunto. No fundo uma agudeza de espĂrito que Ă© incapaz de desviar o projecto da rota traçada – mesmo passando com frequĂŞncia junto de massas de grande força gravitacional – e que o conduz numa aventura que nĂŁo se remedeia com a filosofia de extremos de Sun Ra, mas que procura algo mais na eloquente essĂŞncia da mĂşsica negra. Por isso Space Ă© uma viagem consistente e estimulante, sem grandes extravagâncias, indicado para quem gosta de momentos sĂłbrios e sem sobressaltos de maior.