Ao quarto álbum, Old Jerusalem atreve-se a expandir a sua canção, sem que isso rompa com a identidade estabelecida em trĂŞs discos totalmente merecedores da estima que obtiveram. Two Birds Blessing move-se – no tempo e espaço do cancioneiro Old Jerusalem - e permanece no mesmo abrigo de simplicidade mágica, que fez de Francisco Silva um escritor de canções imediatamente reconhecĂvel por cá (e o principal impulsionador da Borland, casa para a qual gravava atĂ© aqui). Moroso no realce das suas virtudes (nada superficiais), Two Birds Blessing acaba por ser um big bang, que, ao evoluir lentamente, perde o efeito do estrondo e ganha as regalias da durabilidade. Assim, Two Birds Blessing difere dos restantes por parecer muito mais predisposto a canções que tomam o seu tempo, que deixam as suas vias abertas a uma brandura (quase Cowboy Junkies) nada preocupada com qualquer cronometragem.
Posto isto, a duração mĂ©dia das canções – que rondará os 5 minutos – Ă© um daqueles atributos que tambĂ©m fala pela peculiaridade de Two Birds Blessing. Entende-se que seja ampla a lĂłgica de canções que fluem como um rio (e como os temas longos de Smog) em vez de se fixarem num hook, que possa entorpecer a sua alma e intenção. De inĂcio, estranha-se a ausĂŞncia do impacto (e faro pop) outrora anunciado pelo baixo de “180 Days” ou pelo arranhar das cordas da entranhável “Summer of Some Odd Year”, pertencentes a Twice The Humbling Sun e a The Temple Bell respectivamente. Depois de alguma persistĂŞncia, tambĂ©m Two Birds Blessing serve a sua quota de recompensas: repare-se na elegância permanente da guitarra lap steel, no storytelling apurado de “Arduinna and the Science Boy” ou na aproximação aos Radiohead – via versões de Christopher O' Riley -, com o piano de “Pale Mirror of You”. Esta Ăşltima seria altamente improvável num disco mais directo. Sem pressas, a canção Ă© perspectivada a partir da posição do pássaro que sobrevoa circularmente o poiso sem nunca assentar. A imagem parece lĂrica (pecado meu), mas assim tambĂ©m Ă© Two Birds Blessing.
É, alĂ©m disso, bonito reparar como podem estar aqui alguns dos temas que mais declaradamente relembram a paisagem lunar que conduz Matosinhos atĂ© Leça da Palmeira, na marginal adjacente Ă cidade do Porto (o ninho criativo de Francisco Silva). Grande parte destas canções podiam muito bem rebolar-se naquela relva, entre a estátua do homem e das duas moças (perto da Casa de Chá). O Old Jerusalem de Two Birds Blessing Ă© de tal forma despreocupado, que atĂ© omitiu a sugestĂŁo sexual muitas vezes capaz de animar as suas canções mais memoráveis (ocasionalmente, Francisco Silva parece tambĂ©m um James Taylor altamente favorável aos encantos horizontais). Perdoa-se-lhe entĂŁo essa falta de alfazema e orquĂdeas da EtiĂłpia, quando Ă© por demais compensada pela naturalidade que faz deste o mais espairecido disco de Old Jerusalem.