Sempre que a poesia e a música se encontram, e compartilham cumplicidades, fica-se com a nÃtida impressão que algo ficou por acrescentar no passado. É claro que no processo de escrita, e no que aos sentimentos diz respeito, haverá sempre uma sensação sem expressão, uma atitude sem a devida consideração. E não obstante a persistente safra do poeta, a alma que alimenta toda a verborreia encantada é profunda, sábia e nos antÃpodas dos limites conhecidos. É, alias, na ideia do poema idÃlico e inacabado que encontramos a magia da escrita e o poder da palavra como ignição da imaginação. E se a todo o processo se juntar umas quantas notas musicais, o pleonasmo dos sentimentos terá, na certa, outra dimensão artÃstica. Outra dimensão estética.
A procura do equilÃbrio entre a formosura do verbo e rima da música não é tarefa fácil e requer uma certa dose de aventureirÃssimo consciente. Como tudo o que é bem feito demora o seu tempo - e um verdadeiro poeta sente-se sempre incompleto -, não se deve estranhar que apenas agora a norte-americana Jennifer Schwed tenha editado Mellow Dramas, um disco nascido, tal como os trabalhos da Ursula Rucker, da joint-venture com uma mão cheia de estetas das novas electrónicas em downtempo. Da partilha de palavras e sons. Nascido do confronto entre artes distintas que amiúde têm muito em comum.
A profusão da palavra nesta música terá nascido do próprio gosto da artista pela poesia da vida perfumada em sobreposição com as sonoridades mais profundas do nu-jazz, das vagas em slow-motion do hip-hop, dos ecos da Jamaica, do confronto da pop com a soul. E JEN não oculta em nenhum momento as suas preferências musicais, alias exibe-as pela mão de alguns visionários da poesia sonora como Kieser.Velten (desaparecidos desde o eclipse dos Kruder & Dorfmeister), Solar Moon, Can7, Tom Dams (cara metade dos saudosos Karma), Razoof ou os búlgaros Gelka. Todos prestam-se admiravelmente na concretização do desÃgnio interior de JEN, não se rogando em esforços - de pormenor - que culminam em produções competentes e inspiradas.
A voz cândida da poetiza não será alheia ao bom funcionamento do mecanismo romântico que Mellow Dramas exibe com um luminoso garbo. JEN, não possuindo uma voz portentosa, opta pelo tom sereno, intimista e sensual para veicular as suas rimas. Fala essencialmente de amor e das suas eternas conjugações, fala de prazer fÃsico sem resvalar para o excessivo, fala com brio dos sonhos e das relações idÃlicas, para de seguida, se for preciso, falar de desilusões e de desgostos. Tudo num tom que a pop agradece por soar tão bem. Muito bem, mesmo.