bodyspace.net


V/A Controversy

2008
Rapster / Popstock!


É admirável o esforço demonstrado por Prince ao manter uma expressão de agrado na fotografia megalómana que acompanha a frente do seu último disco Planet Earth (que conheceu distribuição revolucionária ao ser oferecido como anexo do jornal Mail On Sunday no Reino Unido). Mesmo assim, o arrojo do anão de Minneapolis, que ousou ser maior que o mundo, em nada se compara com aquele que levou alguém a crer que Controversy podia fazer justiça a Prince através de uma compilação de versões tão descabida quanto terrivelmente planeada.

O mundo sabe do desastre que foi a interpretação em Purple Train e existirá também quem possa não ter ainda recuperado totalmente do trauma provocado pela capa de Lovesexy, em que Prince passou a ser o artista a partir daí conhecido por Adão, mas que mal de maior fez o autor de Diamonds and Pearls para ver o seu legado ser trucidado e desonrado por uma série de versões que, em grande parte dos casos, gravitam em torno de um chill-out sem alma, da pura novidade de longevidade bubblegum ou, no pior dos casos, da electrónica para novos yuppies? Veja-se, por exemplo, como o funk soletrado de “Alphabet Streetâ€, passa à condição de música exótica de supermercado na mão dos Blue States ou como o produtor nova-iorquino Onsulade segue a mesma via com a achega a “Crazy Youâ€. Algures, o Símbolo contorce-se em espasmos de raiva.

Adiante, a frágil seriedade de Controversy atinge fundo rochoso quando os Dynamics tentam conjugar “Girls & Boys†sob a forma de um reggae genérico que ofenderia os fãs de Gentleman. Escapam à guilhotina do desinteresse as apropriações executadas pelo príncipe da nova soul D’Angelo - mesmo assim, capaz de elevar os índices libidinosos de “She’s Always in My Hair†– e Susanna & The Magical Orchestra, que não soa tão chata como quase sempre enquanto aproveita convincentemente a melodia e dramatismo do original “Condition of the Heartâ€.

Ao que parece, as capas dos discos de Prince são de uma importância obrigatória. Afinal, quando, no último Planet Earth, surge diante do globo terrestre, Prince encontrava-se realmente a testar uma versão virtual do software Google Earth e a tentar descobrir a morada dos responsáveis pela concepção desta compilação e de grande parte dos seus intervenientes (D’ Angelo está a salvo). Presume-se que a qualquer altura esses possam receber uma visita de orientação “quebra-ossos†por parte da bisarma que era o baterista da New Power Generation (cujo porte pode ser consultado no teledisco da orgiástica leitura do kamasutra “Get Offâ€). Não há como escapar às evidências: Controversy é, de facto, sofrível na sua selecção e aproveitamento nulo de tão sólido e rico cancioneiro como o de Prince. Estes são os tristes sinais dos tempos.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
18/03/2008