Os lĂĄbios de Yes, U nĂŁo demoram muito a segredar duas evidĂȘncias que muito denunciam o seu delito: a sua estĂ©tica aponta num sentido retro revestido de sofisticação e os seus episĂłdios imorais sĂŁo quase sempre projecçÔes num retrovisor que mais nĂtido torna os apunhalamentos sentimentais que lamentam os Devastations, em romaria pela terra de ninguĂ©m partilhada pelo shoegaze incisivo nas suas intervençÔes e o discreto charme de toda a sonolĂȘncia produzida por uma sĂ©rie de sintetizadores noctĂvagos. O terceiro disco do trio australiano nĂŁo deixa tambĂ©m de fazer com que seja pelo menos meia-verdade toda aquela que comprove a pontaria da Beggars Banquet dos Ășltimos anos no que respeita a alvos bem competentes na alquimia da sua elegĂąncia rock.
Merece um grosso benefĂcio da dĂșvida qualquer disco que se assemelhe Ă banda-sonora que o mundo nunca chegou a conhecer ao tĂłrrido e fetichista romance entre Billy Bob Thorton e Angelina Jolie, com a fantasiosa vantagem da mesma ter sido composta por um Jarvis Cocker a ressacar de This Is Hardcore, o clĂĄssico documento da decadĂȘncia brit-pop que podemos agradecer a uns Pulp de topo. Saliente-se a favor de Yes, U o facto de ambos os seus vocalistas e principais compositores, Conrad Standish e Tom Carlyon, reavivarem convincentemente a sedutora memĂłria de Scott McCloud, o ex-Girls Against Boys que, nos discos de New Wet Kojak, praticava um sussurro tĂŁo sexy que se calcula situada acima do milhar a marca dos celibatos que ruĂram aos pĂ©s do disco homĂłnimo desses Ășltimos.
Ă atĂ© interessante observar como Yes, U pode servir de objecto multiplamente Ăștil a estudos sĂłcio-demogrĂĄficos elaborados a partir de casa. De uma sĂł cajadada, mata-se a curiosidade que possa impedir alguĂ©m de saber que os espaços nocturnos em Melbourne (proveniĂȘncia do trio) sĂŁo mal frequentados, que em Berlim (onde foi gravado o disco) pior ainda e que, a julgar pelo entusiasmo apregoado por Karen O dos Yeah Yeah Yeahs, Nova Iorque tambĂ©m nĂŁo deve andar longe da malha que devasta os bons costumes, substituindo-os por vicio e consumo voluntĂĄrio de venenos nocturnos. Ou seja, Yes, U pode bem ser o disco do ano para quem procura sensaçÔes Interpol, mas que se comprometeu a um jejum induzido pela nĂĄusea que provocou este ano a absoluta saturação do refrĂŁo de âHeinrich Maneuverâ (embalsamado em Our Love to Admire).
Importa, em abono do desenjoo, questionar os Devastations acerca de como andarĂŁo as coisas pela costa oeste das suas caracterĂsticas mais comparĂĄveis. Serve como resposta a isso a proximidade perceptĂvel entre algumas faixas de Yes, U e o que poderia ser âHanginâ Treeâ dos Queens of the Stone Age com a sua velocidade reduzida ao ponto de poder servir Ă avaliação justa da mais polĂ©mica das grandes penalidades num jogo de futebol entre a Inglaterra e a Argentina. TambĂ©m o groove de "Mistakes", por pura coincidĂȘncia ou nĂŁo, podia bem pertencer aos !!! de Myth Takes se estes se encontrassem perto de sucumbir a uma overdose de ketamina. Fica clara a ideia de que Yes, U Ă© grosseiramente lento na entrega do seu corpo Ă s tentaçÔes expostas na montra da noite citadina. Os apreciadores de sexo tĂąntrico podem, no mĂnimo, arriscar uma one night stand ao lado dos Devastations.