Cada vez mais longe do trabalho caracterÃstico de voz e guitarra e de gravações lo fi, Devendra Banhart é um homem novo na altura de gravar um disco. Primeiro porque já não tem medo de entrar num estúdio a sério (em vez de gravar canções ao telefone ou para um 4 pistas); depois, porque gosta cada vez mais de levar as suas canções para territórios distantes da folk. Talvez tenham sido as constantes catalogações de freak folk (que aparentemente aborreciam o música), mas o que é certo é que a área de trabalho de Devendra Banhart tem vindo gradualmente a expandir-se. O anterior Cripple Crow, gravado com toda a trupe de Devendra, era já um disco aberto e novas experiências e Smokey Rolls Down Thunder Canyon surge como a continuação lógica desse caminho.
O tema que abre este novo disco, “Cristobalâ€, induz em erro quem imediatamente pensar que Devendra Banhart voltou à s raÃzes. A sua auto-suficiência e a calmaria lembram os primeiros tempos das canções despidas ao essencial. Mas pouco depois é ver Devendra Banhart explodir em ideias e intenções: isso fica bem claro quando Devendra Banhart viaja até ao Brasil na belÃssima "Samba Vexillographica", materializando finalmente (e de forma directa) a paixão pela música que chega desse paÃs (e por Caetano Veloso). Em oito minutos, “Sea Horseâ€, alimentada a teclas, bateria e baixo, afirma-se positivamente como um dos momentos mais caracterÃsticos do disco: cerimonial, circular e hipnótica até à sua metade, liberta-se depois assumindo a faceta rock sem pudor e ganha pontos com isso – Devendra sem medo da electricidade e de solos de guitarra. “Bad Girl†e “Sea Side†são dois momentos especialmente bons no que toca à escrita simples de canções, resgatando beleza aqui e ali a pequenas coisas – um processo bastante comum neste disco.
“Shabop Shalom†destaca-se em Smokey Rolls Down Thunder Canyon pela sua estranheza. É a peça habitual de Devendra Banhart mergulhado no humor e na bizarria; é, resumindo, um dos momentos mais curiosos de um disco que daqui até ao final se mostra coerente e mais uma prova da busca incessante e da declarada exploração de distintos territórios por parte de Devendra Banhart e da sua pandilha (é que este é mais um disco entre amigos). E talvez seja isto que a música de Devendra Banhart mais necessita neste momento: evoluir para outras paragens. Ser-lhe-ia complicado sobreviver muito tempo com um ou vários Rejoicing in the Hands parte II. Smokey Rolls Down Thunder Canyon, coeso e coerente (e muitas vezes entusiasmante), é o disco certo no momento certo, um espelho do pensamento de Devendra Banhart. Chame-se-lhe hippie ou rei da freak-folk; chame-lhe barbudo ou toda uma listagem de sobrenomes, mas não se negue os seus méritos. Haja Devendra Banhart nesta forma durante muitos anos.