“Uma viagem pela beleza da música”. O autor desta frase é o próprio Laurent Daumail, também conhecido como DJ Cam (ou, mais recentemente, Cam), e é o cartão de visita de Honey Moon.
Cam é um dos mais bem sucedidos representantes da vaga de DJ’s orientados para, e pelo hip-hop. Com uma carreira sedimentada sobre uma quantidade muito razoável de discos, quase todos eles de qualidade acima da média, apresenta em Honey Moon um “doce” que não é muito frequente saborear nos dias que correm. De facto, não estamos perante um álbum de originais, mas sim diante de 13 temas de outros artistas, seleccionados por Cam.
Pessoalmente, Ă© com particular curiosidade que me debruço sobre este tipo de iniciativas, principalmente num caso como este, em que o responsável pela “triagem” dos temas Ă© um mĂşsico que se destaca pelo virtuosismo em seleccionar, cortar, colar, manipular, alterar e retocar pequenas partes isoladas tendo em vista obter um todo, sem comprometer pontos tĂŁo fulcrais como o equilĂbrio e a harmonia do produto final. Quanto mais nĂŁo fosse, o simples facto de constituir uma montra das preferĂŞncias de DJ Cam serviria como incentivo Ă descoberta deste Honey Moon.
Ao contrário de DJ Shadow (muito embora o americano tenha avançado para territĂłrios bastante diversos, em “The Private Press”), EL-P ou Cut Chemist, Cam nĂŁo tem por hábito investir em percussões insistentes e doses industriais de scratching, mas sim em agradáveis combinações de beats leves e pacĂficos com uma miscelânia de outros elementos facilmente associáveis a gĂ©neros como o jazz e o dub. É, assim, raro encontrar uma mĂşsica nos registos de Cam que nĂŁo seja suave e descontraĂda, sem abdicar do requinte e sofisticação que a toada eminentemente orgânica se encarrega de sublinhar.
Sabido isto e ouvindo o álbum sobre o qual se fala, salta desde logo à vista que Honey Moon pode ser aceite como um reflexo das influências orientadoras do seu autor. Olhando para os autores de cada tema, encontramos representantes desta e daquela face do prisma através do qual DJ Cam olha quando cria alguma coisa: de contemporâneos como Coldcut e Mr. Scruff a históricos como Henry Mancini e Grover Washington, Jr., Honey Moon abraça um leque de músicas que, embora pautadas essencialmente por amostras leves e agradáveis de jazz e de hip hop, poderiam (depois de devidamente dissecadas e trabalhadas) resultar em mais uma nova música de Cam.
E Ă© mesmo de uma viagem pela beleza da mĂşsica que se trata, explorando elementos mais clássicos em faixas como a belĂssima “Loran’s Dance” (que dá as boas vindas ao ouvinte evoluindo em redor do saxofone de Grover Washington) e “Lujon” (lounge mais lounge que este instrumental que serve como desfecho do álbum, nĂŁo há), e o hip hop underground. É mesmo em torno do hip hop que se desenvolve o corpo deste disco, sobressaindo os bonitos samples de piano acompanhados por MC’s que, ao contrário do que poderia acontecer, nĂŁo perturbam a delicadeza das mĂşsicas, oferecendo ainda mais riqueza Ă s mesmas. Pelo meio, apenas (mais) uma versĂŁo de “Autumn Leaves” interrompe a onda minimalista predominante.
Em jeito de conclusão, Honey Moon é uma selecção “inteligente” que evidencia um extremo bom gosto. Bastante homogéneo e equilibrado, é um excelente disco tanto para ouvir descomprometidamente, como para acompanhar de sentidos despertos.