No momento em que a trajectória da premissa original dos I2I foi alterada, nada voltou a ser o mesmo. E se podemos afirmar que a mudança de curso não foi totalmente perniciosa, não deixará de ser pertinente referir que há música que nasceu para não ter palavras. A desconfiança que ainda existe entre nós em torno de temas hip-hop instrumentais impede a reverência da experiência e afasta algum pretensiosismo estético, que até seria desejável. Em Portugal, com honrosas excepções de Sam The Kid ou Rocky Marciano, poucos têm investido nesse tipo especÃfico de produção com receio de passarem despercebidos ou de serem incapazes de elaborar um punhado de temas com o mÃnimo de narrativa sonora.
Os I2I iam no caminho certo. A componente instrumental d' O Tempo Está a Acabar não sofre das limitações mecânicas que outros produtores demonstram na arte da construção dos beats e na criação de envolvências melódicas; aliás Michelangelo e K manifestam um sentido estético correctamente defendido e elaboram um conjunto competente de quadros sonoros apocalÃpticos que, tendo o trip-hop experimental e soturno como entusiasmante ponto de partida, encontram nos Sofa Surfers de Encounters a verdadeira inspiração. Mas se os austrÃacos tinham consciência que o quadro apocalÃptico sonoro que dominavam ajustava-se à mensagem politica pós-milénio, I2I revelam deficiências na integração dos seus convidados e permitem que as palavras inócuas arruÃnem os reais propósitos da operação.
Não deixa de haver momentos entusiasmantes em que um conjunto de vozes sem corpo dão a forma desejada à perturbante estrutura que sustenta as ideias maquiavélicas da dupla, mas na grande maioria das vezes os convidados – Regula, Criatura, Fuse, Tekilla e Chullage – distinguem-se por verbalizarem uma escrita pobre, atafulhada e sem grande dignidade, onde o tempo e espaço raramente são respeitados. Para os convidados o ambiente não deixa de ser distante e alienÃgena, talvez por isso a adaptação a esta sonoridade seja difÃcil para todos e crÃtica para os objectivos de Michelangelo e K, que ambicionando uma maior exposição mediática ou uma desnecessária vassalagem ao rap, perverteram a lógica da operação e atiraram ao fogo a oportunidade de deixar o seu marco na produção nacional. O que não deixa de ser uma pena.