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Shapes and Sizes Split Lips, Winning Hips, A Shiner

2007
Asthmatic Kitty


Existe um qualquer factor explosivo que determina, a favor dos Shapes and Sizes, este seu segundo longo-duração como um campo de minas que oferece escassa superfície para o pé pisar em segurança. Isto porque assim que a sola crê ter assimiladas as coordenadas a um território familiar entre o rock independente e a folk extrovertida (para ser entoada à volta da fogueira), os quatro canadianos reformulam as regras do jogo até um ponto em que o aspecto excêntrico do tabuleiro silencia as categorizações. Split Lips, Winning Hips, A Shiner necessita apenas de um terço da sua duração para garantir que a sua experiência será equivalente à da mais alucinada montanha-russa, mesmo que, por diversas vezes, bifurcada entre estados clinicamente perigosos de euforia e outros tão reservados como aquele que sente um gnomo que observa o florescer da horta a partir de casa.

O valor que reclamam as várias portagens espalhadas por Split Lips... é o de uma apreciação que se decida por tomar o disco como uma rota apontada ao optimismo ou a um inverso mais incerto (a marcha “Victory in War†– tornada triunfal com os sopros - observa de perto o dilema patriótico Americano). As tais minas são também dicotomias que se descobrem a títulos como “Alone / Alive†ou “Teller / Sellerâ€, ou ao diferencial que separam as faixas onde é mais dominante a radiância estridente da voz de Caila Thompson-Hannant, de um exercício como “The Horse’s Mouthy Mouthâ€, que, estruturalmente, alterna entre a ameaça constante de crescendo e a sabotagem microscópica imposta por detalhes da guitarra que, acumulados, pesam como areia.

A última mina a estoirar, em vez de fogo, solta uma bandeira branca onde se lê “esquizofrenia omnipresente†– nada que se esperasse de quatro músicos mentalmente sãos (ou assim parecem nas fotos promocionais), mas algo altamente desejável quando recebido da parte de gente que examinou bem a escrita de canções às óperas indie assinadas por Sufjan Stevens e pelo seu tutor Danielson. O estudo exaustivo do limiar entre a simplicidade e o grandioso valeu aos Shapes and Sizes uma mão cheia de canções em que, como no teledisco “It’s Oh so Quiet†de Björk, tudo parece contido em calmaria até estalar a reacção química emocional que dá vida e êxtase a um marco de correio e a guarda-chuvas. Isso vale por si só a recomendação. Mais um ponto a favor do Canadá, portanto.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
30/07/2007