O conceito de isolamento não é completamente inédito no catálogo da label australiana Room40 que persiste em manter impressionantemente estáveis os índices de regularidade e qualidade. Aquando do arranque das suas actividades, havia já sido lançada uma compilação dupla de nome Melatonin à consideração da influência do som no sono. Participavam nessa nomes frequentes da Room 40, como Oren Ambarchi ou Philip Samartzis (orgulho marsupial), camaleões naturais como Pimmon e um cientista do próprio conceito, DJ Olive (que, inclusive, lançou entretanto Sleep como segundo tomo de uma trilogia ambient). Desta feita, On Isolation propõe-se, por sua vez, a explorar diferentes perspectivas do isolamento face a códigos familiares, espaços sociais ou protocolos.
Cruzadas as informações fornecidas por Melatonin e o novo On Isolation, o sono passa a ser também qualificável como isolamento face a um vigília sensorial mantida em desperto estado consciente. Quando grande parte - se não mesmo todos - os intervenientes convidados são estudiosos exaustivos do som, não admira que sejam também agentes de pertinentes testemunhos acerca do isolamento próprio da investigação. O facto de ser muito natural visualizar os estetas presentes a vacilarem, fatigados e de olhos semi-cerrados, sobre um laptop, só reforça a ligação entre o sono e quem não cessa de descobrir possibilidades ao som.
Embora sejam infinitas as possibilidades do conceito, as representações do mesmo ficam-se, na maioria, pelo minimalismo que mais revela quando menor é o seu caudal sonoro. Cada caso é um caso. David Toop surge, em “Chair creaks, though no one sits there”, como um pensador alienado pela obsessão que o prende a uma cadeira que emite ruídos. Exercício típico de quem fez da vida uma cruzada pela ampliação de sons à partida insignificantes, optando mesmo por ter documentado isso num cativante livro intitulado Haunted Weather. O caule e domínio da matéria-prima descobre-se também a dois nomes de que é sempre bom receber novidades: Steinbruchel soma pontos numa “Mono” que só vem frisar o cristalino e melódico estilo distinto do suíço, enquanto que “Bryry” serve como excelente e apurado anexo ao escapismo paisagístico oferecido pelo experiente Zane Trow no precioso disco de uma vida, For Those Who Hear Actual Voices (cuja capacidade curativa não se extingue, mesmo após ultrapassada a centena de escutas). Em representação dos estetas mais afeiçoados aos field recordings, Greg Davis assina o excerto de uma “Riwalla Farm” que é pura antítese do turbilhão de ruídos que em Ku o aliava a Jeph Jerman também aqui presente com um aparentemente pacífico “Albuquerque Hotel Room”. Em ambos, os sons partem alinhados enquanto sinais de relevo que só muito esparsamente interrompem um silêncio estático quase tão tenebroso como no mítico manifesto vegetariano O massacre no Texas.
Sem deixar de manter algum valor pedagógico (até porque serviu a uma conferência universitária), On Isolation revela, a favor dos artistas sonoros que nele participam, que o isolamento pode também ser a quarentena a que se vota o segredo de um método ou exercício cuja natureza é inteiramente dominada apenas por quem o produziu ou arquitectou. A instauração dos quinze enigmas aqui aglomerados acaba, de modo implacável, por isolar, até certo ponto, quem ouve daquilo que ambiciona descobrir.