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Radio Birdman Zeno Beach

2006
Bittersweet Recordings / Popstock!


Compreende-se que o risco de Zeno Beach não seja o mesmo do seminal EP Burn my eye, que, em 1976, correspondia ao trampolim incendiário que haveria de projectar os seus autores em órbita de culto, quando antes desse lançamento eram apenas o conjunto de rostos anónimos sobre os quais se fechavam as portas de labels que precipitadamente rejeitaram uma peça-chave do punk australiano. Os Radio Birdman, porém, não parecem conformados com o estatuto arrecadado por essa altura. Nem sequer acusam a inércia que pudesse impor o facto de actualmente gozarem de estabilidade em empregos excepcionais (o guitarrista e mentor técnico Deniz Tek usufrui de alta patente em aviação). Zeno Beach não é certamente o disco a que se sujeitam, na corda bamba do ridículo, as bandas cujos membros não sabem se o melhor será dedicar a mão direita ao instrumento ou ao marfim de uma bengala. Enquanto culminar de uma certa vaga de revivalismo, o primeiro disco de originais em dezoito anos, maioritariamente preenchidos por longos interregnos, deve grande parte da sua pertinência e sentimento de urgência à homenagem que havia a prestar ao entretanto falecido baixista Carl Rorke, que chegara a integrar o colectivo.

Apesar de implícita, a elegia fúnebre reveste todo o grafismo de um Zeno Beach formado, na sua maioria, por faixas que soam como ampulhetas em vertigem vertical obrigadas a execuções directas apenas sabotadas por solos de guitarra pouco menos que aceitáveis. “We’ve Come so Far (To Be Here Today)†verbaliza os motivos do regresso e prova que, assim como indica o seu nome, o vocalista Rob Younger arremessa um provocador refrão com uma jovialidade que provavelmente não lhe anteciparíamos. Existe um aditivo revestimento soul conferido pelos teclados que tornam ainda mais evangélico o regresso dos Radio Birdman. “The Brotherhood of Al Wazah†recorda, da maneira mais dignificante e com camaradagem entre piano e guitarra, o talento do ex-Clash Joe Strummer para a escrita de hinos derrotistas tão grandiosos como aqueles que colocavam nos píncaros os vitoriosos. Zeno Beach convence tão certeiramente que apetece invocar para o caso as palavras de outra entidade musical actualmente a viver nova vaga de revivalismo: os Joy Division e o mote Dance, dance, dance, dance to the radio que jamais deixou de ecoar.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
21/05/2007