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Sleeveface: Madvillain - Madvillainy
· 09 Fev 2010 · 13:15 ·
© Mauro Mota


No cinema, o Fantástico ensinou-nos a desconfiar da morte do vilão, mesmo que o seu corpo esteja dividido em cem pedaços espalhados pela lagoa. É estranho perspectivar Madvillainy como uma ressurreição logo na primeira iniciativa conjunta de Madlib e MF Doom, mas estes 22 temas (sem refrão ou hook fácil) mais não são do que versículos altamente citáveis do manual dedicado ao mais autêntico hip-hop. E todo este conceito do álbum-vilão adequa-se perfeitamente a MF Doom, o MC em vigília permanente, e a Madlib, o super-produtor omnisciente, que não dorme para viver mil vidas nos seus discos. Juntos formam um vingador inédito chamado Madvillain. Isto explica também a máscara numa capa que presta subtil homenagem ao debute homónimo de Madonna (também ela um camaleão imortal). Não deixando nunca de ser um álbum de hip-hop, Madvillainy pode ser comparado a muitas outras coisas: a um videojogo ritmado (“Do not fire!” sampla a sonoplastia de Street Fighter II); a um filme formalmente livre (noutras ocasiões, Madlib filma a sua música sob o pseudónimo de Beat Konducta); a uma série de 22 vinhetas de banda-desenhada (reparem no imaginário); ou até a uma antologia não declarada de outros (a extensão que os DJs utilizam para deixar pistas obscuras aos seus pares). Num tempo (2004) em que o único propósito do género parecia ser a sua eficiência comercial na internet, rádio e televisão (com a tomada de posse sulista dos Outkast, surgida após o reconhecimento de terreno efectuado pelos Goodie Mob), Madlib e (MF) Doom comprovam, assim, a versatilidade do hip-hop como camuflagem para quase todo o tipo de narrativas. Até esse manifesto surge disfarçado num disco perfeitamente lúdico. Valeu a pena resistir a alguns empurrões para comprá-lo por sete euros e meio nos saldos da Flur.

Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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