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Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX lançada em quatro luxuosos volumes
· 25 Jan 2010 · 12:10 ·


Com direcção de Salwa Castelo-Branco e selo do Círculo de Leitores, acaba de ser publicada a Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, apresentada como a "primeira grande obra de referência dedicada à música praticada em Portugal ao longo do século XX". Parece um verdadeiro luxo. Com 4 volumes, inclui mais de 1250 entradas, 550 imagens, índices temático e onomástico. Dá um grande abraço na música erudita, na música popular, na música tradicional, no folclore, no pop-rock, no jazz, no fado, na canção de Coimbra, e na música nas comunidades migrantes, abordando ainda modos expressivos em que a música desempenha um papel central, como a dança, o cinema e o teatro. Mas há mais: a EMPXX, abreviada assim para os amigos, engloba os meios de comunicação de massa que tiveram impacte nos domínios musicais analisados, nomeadamente a edição de música impressa, a indústria fonográfica, a rádio e o cinema.

O primeiro volume já está à venda e os próximos três que completam a obra chegarão às lojas ainda no decorrer de 2010. Para percebermos um pouco o trabalho e o valor da Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, fomos falar com Leonor Losa, membro do Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa, colaboradora da Enciclopédia da Música em Portugal no século XX, que trabalhou sobre a indústria fonográfica em Portugal.

Como foi fazer parte desta experiência para ti?

Pessoalmente, iniciei a minha formação na área da investigação em etnomusicologia no projecto da Enciclopédia da Música em Portugal no século XX. Foi experiência (que no meu caso se prolongou ao longo de sete anos!) onde beneficiei sobretudo da “troca†e construção conjunta de conhecimento, por ter sido um ponto de discussão aberta em permanência, um processo de desbravamento da realidade da produção musical em Portugal ao longo de um século, de confronto entre vários pontos de vista, várias formas de encarar a música, diferentes contextos de produção e entendimento da música enquanto produto (social, cultural, mercantil etc). A mais valia foi sempre a utilização do diálogo como ponto de partida sobretudo, a aproximação a músicos, editores, entusiastas, produtores de opinião etc. com quem trabalhamos em conjunto para colocar por escrito processos e eventos que não haviam ainda sido interpretados e que são parte da história da cultura expressiva do país.

Sentes que esta enciclopédia vem preencher um vazio enorme de publicações nestas áreas?

Sem dúvida, preenche um vazio de publicações, que correspondia a um certo vazio de reflexão e conhecimento, apesar dos pontuais estudos que se têm vindo a realizar. Importante notar que este vazio não corresponde de forma alguma a um vazio musical do país! No entanto, a meu ver, vem sobretudo inaugurar um terreno de discussão sobre a música em Portugal de forma transversal, e alienando-se das categorias que muitas vezes estão subjacentes nos discursos sobre a música (e as artes em geral), que tendem a hierarquizar diferentes domínios musicais, que no fundo são apenas reflexos de diferenciações sociais, a meu ver, ultrapassados.

No que toca às áreas que mais interessam ao Bodyspace directamente, o pop-rock, jazz, o punk, a música tradicional, como resumirias os critérios e a pesquisa desenvolvida?

Em relação à pesquisa desenvolvida, o núcleo coordenador da obra (Salwa Castelo-Branco, Rui Cidra, António Tilly, Pedro Roxo, Pedro Félix) e os diferentes consultores para cada área, procuraram, antes de mais e de forma dinâmica, interpretar os diferentes domínios (o pop-rock, o jazz, a música tradicional, a música erudita etc.). Compreender a razão pela qual se organizam diferentes constelações socio-musicais em torno de diferentes práticas e porque razão estas se diferenciam das outras. Por um lado, compreender porque os músicos definem a sua música como pertencendo a um domínio específico, por outro, indagar “musicologicamente†a terminologia e os traços genéricos dos diferentes estilos musicais. E por último, confrontar dialogicamente ambas as acepções. Tanto o jazz como o pop-rock ou a música tradicional contam com textos de carácter reflexivo, interpretativo e histórico, acerca da sua prática e expressão no país, pondo em evidência processos de mudança musical, social, apropriações ideológicas etc. Além desses textos, cada área contou com uma selecção de intérpretes, grupos e agentes culturais associados que figuram com textos individuais na enciclopédia. A coordenação da obra não pretendeu realizar uma enciclopédia exaustiva (que seria praticamente impossível do ponto de vista do tempo), mas seleccionar aqueles que, por motivos distintos, deram um contributo em cada época, dando uma perspectiva abrangente dos diferentes domínios musicais. Dando o exemplo do pop-rock, a investigação foi realizada por diferentes investigadores que trabalham a área (Rui Cidra, António Tilly, Pedro Félix, Ana Filipa Carvalho, Miguel Almeida, Gonçalo Antunes e.o.). As escolhas de textos presentes na EMPXX reflectem diferentes momentos da sua história, desde o momento inicial das primeiras tipologias rock’n’roll nos anos 50, ao surgimento de expressões sub-culturais do pop-rock, como o punk ou o heavy metal, ou as transformações ocorridas na indústria fonográfica no final do século. Em cada um destes momentos, diferentes intérpretes e grupos foram representativos, e foi o cuidado de os ter presentes no corpo da obra que prevaleceu.
André Gomes
andregomes@bodyspace.net

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