RETRO MANÍA
CHARANJIT SINGH E AS SUAS RAGATRONICS
· 04 Set 2014 · 00:51 ·
O Acid House afinal nasceu na Índia em 1982. Sim, 1982.
© Knelis

Primeiro, a culpa é da Roland. Os seus TR-808 e TB-303 revolucionaram a música, em particular o 303, ícone do acid house de finais de oitentas. Em 1982 tinha sido acabado de lançar e chegou à Índia, pátria da poderosa e prolífica indústria cinematográfica de Bollywood, geradora e empregadora de incontáveis temas e compositores musicais. Charanjit Singh é um deles e um dos poucos, mas bons, que abraçaram o “disco sound” nos seus temas. Eram tempos de clássicos como “Yaad Aa Raha Hai” do soberbo Disco Dancer do mago Bappi Lahari. Comprado em Singapura, o seu novo “brinquedo” fê-lo descobrir as suas possibilidades combinadas com o que já tinha - um Jupiter 8 e um TR-808 - e acrescentado-lhes um absoluto feeling indiano, conseguindo adicionar à toada disco dancing algo mais, algo novo, incaracterístico, estranhamente hipnótico, cujo minimalismo encaixa que nem um sari na mantricidade do música raga.

Synthesizing: Ten Ragas to a Disco Beat nasce assim em 1982, cinco anos do arranque oficial do acid house em Chicago e Detroit, e pela primeira vez, Charanjit não tem sucesso comercial. Talvez razão para não seguir esta via, não lhe dando continuação, voltando mais tarde para outras experiências, incluindo calypso. Tornou-se assim um objecto singular de tão singular. Pudera, é normal acontecer isso a discos à frente do seu tempo. Ouvi-lo é entender toda a uma geração posterior made in Roland que evoluiu em poucos anos até à mistura Goa e trance que agora faz ainda mais sentido, a braços com esta descoberta. Este disco não terá sido ouvido na altura pela maior parte dos cérebros que criaram e desenvolveram o género e seus derivados. A evolução da electrónica pós-TB-303 foi natural. Charanjit apenas se antecipou uns anitos e chegou antes de todos ao enquadramento perfeito entre o exotismo, electrónica e o modo “glissando”, num sentimento de pertença mútua paralelo a quem nasceu realmente um para o outro.

Esquecido então durante décadas, o disco ressurge com algum estrondo em nichos de apreciadores, já este século, em registo de reedição, fomentando contudo várias teorias da conspiração, de que se tratava de algo falso, ainda por cima não sendo inédito casos desses na história da música (alô Jelinek aka Ursula Bogner). Ainda agora há essa nuvem sobre o já lendário Lewis, mas se o obscuro canadiano ainda não apareceu em carne e osso para calar o cepticismo, neste caso, após muitas buscas, o músico de Mumbai foi encontrado, tendo já voltado a tocar este disco no Ocidente, passando por entrevistas, uma delas com os fãs confessos, Modeselektor, com o alto patrocínio de uma bebida energética. E pronto, agora é tempo de ragatronics.









Nuno Leal
nunleal@gmail.com

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