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Tren Go! Sound System
Próxima paragem: Guitarra


Pedro Pestana não é trengo. Mas é Tren Go!, e é um sistema de som de um homem só com a sua guitarra. E cumpre quase todos os requisitos para se gostar de uma pessoa: faz boa música, esteve no Milhões de Festa, e é Portista. Um belíssimo triunvirato de qualidade, portanto. A mesma que se encontra em Wooowoooo, que é o seu registo de estreia depois de um período considerável de experiências, e que pode ser descarregado e ouvido de forma gratuita no site da url: http://www.loversandlollypops.net/ text: Lovers & Lollypops. Não fugindo à temática que aborda, é um disco que serve para acompanhar viagens de comboio, onde se encontram passagens instrumentais carregadas de blues, de surf, de rock, de ruído (do bom). E de imaginação, bastante, não estivesse ele igualmente ligado à área do cinema. O Bodyspace foi falar com o maquinista e trouxe coisas que vale a pena saber.
O teu projecto já existe há alguns anos, mas só agora lanças o álbum de estreia. Porquê?

Por causa de uma série de factores. De facto o álbum estava pronto desde 2009, apresentei o produto finalizado a umas editoras para edição física mas o processo foi-se atrasando - ou porque não havia dinheiro ou calendário, ou porque faltava um pormenor aqui ou ali, e fui deixando as coisas andarem por compromissos profissionais. A conjuntura actual também não ajuda a que a malta esteja disposta a pagar discos de um gajo desconhecido. Em conversas com a L&L, que sempre manifestou simpatia e interesse pelo projecto, ficou decidida a edição online e gratuita. A coisa já estava a ficar velha e não fazia muito sentido estar a guardá-la na gaveta.

A gravação do disco foi de algum modo “fácil”? Já tinhas tudo planeado antes de o gravar ou surgiram novas ideias enquanto o fazias?

O desafio da gravação do disco surgiu no verão de 2007, a partir do Marco Lima (dos grandes Spincity), que tinha o seu estúdio, o Hertz Control, prontinho a funcionar. Gravámos em cinco dias, em Outubro desse ano. Tinha já planeado que músicas é que iria gravar e como as queria gravar e só uma é que não foi colocada no alinhamento final. No estúdio tinha 16 amplificadores de guitarra, 24 pedais e 32 guitarras e baixos à escolha e tudo velhinho, para alem do Rodrigo Areias me ter emprestado uma guitarra e uns pedais igualmente velhos! Trabalhar com o Marco é muito fácil. Falamos a mesma espécie de dialecto "roquenerolês". Ele sabia do que andava à procura, pois tinha acompanhado as minhas gravações caseiras todas. A ideia de gravar em estúdio foi também explorar o espaço que não existe nas gravações ao vivo (como as que costumo fazer em casa). A este espaço normalmente chamamos stereo (esquerda/direita) mas neste caso há músicas que me soam melhor se as colunas estiverem numa posição frente/trás, como a "Chicky Freaky Piu Piu Flush" - até parece que se surfa! Usámos muitas vezes umas colunas Leslie que andam à roda, o que potencia o stereo com o efeito de Doppler! O que demorou mais tempo foi a edição de som, com todas as suas vantagens (prestar atenção ao detalhe) e desvantagens (perder objectividade). Durante o processo todo usámos técnicas mistas entre o analógico e o digital. Embora o suporte de gravação fosse digital e a edição de som feita em computador, a mistura foi feita em tempo real numa mesa daquelas antiguinhas.

Tocaste no Milhões de Festa em 2010 e lanças agora o álbum pela Lovers & Lollypops. É uma relação para durar?

Não vejo razões para não durar. São boa gente, têm um excelente gosto musical, trabalham bem e fazem a malta sentir-se bem!

“Ofereceste” igualmente uma faixa à compilação da mpd – música pop desempregada. Como surgiu esse convite? Sentes alguma relação entre a música que fazes e esse rótulo, precisamente?

A mpd, a meu ver, vai um pouco para além do que está escrito no rótulo. O manifesto tem isso explicado e é também uma forma de fazer e criar música que de certa forma está próxima a momentos do meu processo criativo. O convite surgiu do excelentíssimo Emanuel Botelho, que gosta muito de TG!SS.

Sendo que és só tu, ela e efeitos, qual consideras o limite para o que se pode fazer com uma guitarra? Houve nalgum ponto de tempo a intenção de convidares mais alguém?

Tive um professor, o Pedro Guedes, que uma vez nos propôs um trabalho com imensas limitações... na minha impetuosa juventude perguntei se não era possível fazer outro projecto com menos limites, para ser mais criativo. A resposta foi qualquer coisa como «terei que ser mais criativo para poder tirar o máximo partido dessas limitações». A duração máxima dos loops das músicas no álbum é de 2,6 segundos, o que o meu pedal de loops fazia na altura. Em relação a colaborações, em TG!SS as portas não estão fechadas, mas tenho algumas dificuldades em ter horários fixos, devido novamente a compromissos profissionais, e é complicado ensaiar. Tanto que perdi um pouco a prática de tocar com gente que dá mais do que um acorde na mesma música.

Já compuseste música para uma curta-metragem. Wooowoooo parece, igualmente, contar uma história... este tom cinemático é importante quando tocas, isto é, vais tocando à medida que te vão ocorrendo imagens de algo?

A relação com o cinema é muito próxima, na verdade. Trabalho em som para cinema, desde as capturas à pós-produção ou sound design. Comecei na música, mas o cinema ensinou-me imenso sobre ela - e vice-versa. Nunca compus especificamente para nenhum filme, mas vários realizadores (entre eles Tiago Afonso, João Rodrigues, Soetkin Verstegen ou Rui Rodrigues) gostaram de algumas das minhas músicas caseiras e pediram-me para as utilizar. Até agora houve só um filme em que o som é practicamente todo de TG!SS (Prosopagnosia, de René Alan). Nesse, além dos feedbacks todos, até o som de uma máquina de barbear foi feito com uma guitarra!

Esta temática à volta de comboios é para manter mesmo depois do aumento dos preços e do fecho de linhas?

Nem me fales... no dia 15 de Outubro [manifestações] quero ver toda a gente na rua! Acho que vou passar a usar aquelas maquetes de comboios e linhas de brinquedo com modelos à escala real! Aí deve ser possível fazer redução de custos e é sempre a andar! Wooowoooo!

Por onde passa o futuro de Tren Go!? Vais andar por aí em tour?

Logo se vê, um passo de cada vez... mas cheira-me que sim, que haverá concertos por aí.

O que é que o Vítor Pereira tem de fazer para que a equipa volte a jogar como deve ser?

Ui, não me queria meter no trabalho do homem... acho-o perfeitamente capaz de por aquela matéria-prima a render! Tive pena do Ruben Micael ter saído, mas o esqueleto continua o mesmo. Bom, mas assumindo o papel de treinador de bancada: privilegiar o colectivo, potenciando as individualidades sem no entanto estar dependente delas (isto dito por uma one-man-band tem o seu lado irónico). Jogar mais na onda toque-a-toque, sempre com a baliza na mira! O tiki-taka irrita-me um bocado mas há rotinas que se podem ir buscar e que podem ser úteis a qualquer equipa. Os Portos do Robson, do Mourinho e do Villas-Boas foram os meus preferidos, é ir lá buscar informação! Também curtia a ousadia do Adriaanse em jogar a 3-3-4, à Championship Manager (pessoalmente, no jogo, preferia 2-4-4). Nas competições nacionais resultava mas nas europeias era assustador!


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
19/10/2011