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Norton
Nova vida


Depois de um disco de remixes em 2005, intitulado Frames - Remixes & Versions, os albicastrenses Norton regressaram recentemente aos discos de originais. E fizeram-no na esperança de mudança e regeneração. Chamaram-lhe Kersche e convidaram uma série de convidados para a operação. Antes de aterrar de vez em Portugal, Kersche viajou até Nova Iorque para receber os últimos - mas determinantes - retoques. A satisfação dos Norton com o novo disco é óbvia nas suas palavras. E o orgulho no trabalho é tanto que os albicastrenses parecem estar a apostar forte em mostrar o disco fora do país. Em entrevista ao Bodyspace, Pedro Afonso e Rodolfo Matos aceitaram esclarecer alguns pontos essenciais relativos ao lançamento de Kersche - e não só.
O que é que na vossa opinião mudou nos Norton deste o último disco até este novo Kersche?

Pedro Afonso: Sinceramente mudou quase tudo, à excepção da identidade musical que nos caracteriza enquanto banda. Hoje somos pessoas mais maduras, com uma experiência e ambições diferentes das que tínhamos quando lançamos o Pictures em 2004. O que não correu bem no passado foi uma forma de aprendizagem para não voltarmos a cometer esses mesmos erros. Durante o tempo (cerca de um ano) que tivemos sem tocar ao vivo, tivemos sempre a trabalhar e a preparar toda a parte mais logística da banda. Quando assim é, é mais que normal que encontrem uma grande “ponte” nos Norton de 2004 para os de 2007.

Como foram os momentos de composição e gravação deste novo disco? Foi um processo demorado?

P.A.: Curiosamente o Kersche começou a ser composto ainda em 2004. Como já referi, tivemos cerca de um ano sem tocar ao vivo por opção própria da banda. Sentimos uma necessidade extrema de voltar à rotina da sala de ensaios para criar coisas novas, experimentar material novo que tínhamos acabado de adquirir. No processo de composição tivemos a sorte de poder fazer pré-produção, algo que nunca tínhamos feito. Foi bastante benéfico para nós, já que, há medida que íamos gravando algum material que íamos compondo, íamos percebendo mais facilmente pequenos defeitos na composição, sons que não encaixavam, frequências que chocavam etc.

Rodolfo Matos: A nível de gravação nunca tínhamos estado tanto tempo em estúdio como com este disco. Foram quatro meses nos Golden Pony Studios em Lisboa com o Eduardo Ricciardi - produtor. Fartamo-nos de experimentar, e aprendemos imenso com esta gravação. Houve também pela primeira vez uma música toda criada em estúdio, algo que nunca tinha acontecido connosco anteriormente.

Sentem-se satisfeitos com o resultado final?

P.A.: Sim, muito mesmo! Estávamos ainda a meio das gravações e já sentíamos que o disco estava a ganhar a forma que tínhamos desenhado para ele. Claro que no final, estávamos mais que orgulhosos do produto final!

R.M.: Imenso! O disco saiu do estúdio no final das misturas a soar muitíssimo bem. Mas quando voltou da masterização em Nova Iorque estava mesmo perfeito, como tínhamos imaginado.

Neste disco surge uma aposta clara em convidados exteriores à banda. O que nos podem contar acerca dessas participações?

P.A.: Sinceramente fomos para estúdio sem essa preocupação. As participações surgiram naturalmente com o decorrer das gravações. Mesmo antes de começarmos a gravar já tínhamos falado com eles, sem grande compromisso e eles mostraram-se imediatamente disponíveis. Isso mostra muito a boa relação que temos com todos eles, além disso, apostamos claramente em pessoas que compreendem o nosso trabalho e que, acima de tudo, gostam dele.

R.M.: No disco anterior houve uma preocupação maior com os convidados, fizemos convites formais... foi diferente! Com este apenas convidámos amigos, o Manuel Simões e a Filipa Venâncio estavam às vezes de visita ao estúdio e foi quase óbvio saltaram do sofá da sala de estar para a sala de captação. O João Santos já tinha sido nosso músico convidado ao vivo e já tínhamos decidido que iria tocar connosco em todos os concertos deste disco, logo era óbvia a sua participação nas gravações. O João Valente apareceu porque precisávamos mesmo de uma voz diferente para aquele tema, sempre adorámos a maneira como canta e a facilidade com que o faz, ele não cantava à mais de quatro ou cinco anos, entrou no estúdio ouviu a música e gravou ao segundo take, foi óptimo. O convidado mais pensado desde inicio era mesmo o Nuno Gonçalves, já tínhamos partilhado palcos, ele já nos tinha remisturado só faltava mesmo participar num disco, tínhamos lá aquele acordeão mesmo à espera dele.

Porque o titulo “Kersche”? Como surge essa designação?

P.A.: O nome “Kersche” surgiu numa noite em que estávamos no estúdio. Nunca foi fácil dar um nome a um disco. É transpores para uma palavra, a identidade dum conjunto de 10 canções, que vale muito mais que isso. Quando o nome saiu de um dos elementos da banda foi imediato o senso entre nós: “Kersche” é o nome que melhor espelha este trabalho.

R.M.: Na altura já tínhamos visto os primeiros esboços da capa, já sabíamos como o disco final iria soar e foi tentar encontrar uma palavra simples e bonita que transmitisse o que é o disco no seu todo, música, capa, ambiente... sugeri o nome e ficou!

O que nos podem dizer da edição do disco propriamente dita? É uma edição da Skud & Smarty com distribuição da Naked, certo? Como se dá esse encontro?

P.A.: Já anteriormente com o Pictures foi uma edição conjunta Skud & Smarty e Borland. Como já não trabalhamos com esta ultima, optamos por fazer uma edição única com a Skud & Smarty. Desde sempre que acreditam no nosso valor e nunca deixaram de nos apoiar, já com projectos anteriores que tivemos. Devido a alguma insatisfação que sentimos com outras editoras com quem trabalhámos, optámos desde o início por fazer a edição do Kersche apenas com eles. Como a Skud & Smarty não trabalha tanto a nível de distribuição, a Naked surgiu mais nesse sentido. Houve interesse da parte deles em trabalhar connosco, as coisas aconteceram naturalmente.

O artwork do disco é da responsabilidade da Meedchen. Como é que decidiram recorrer ao trabalho deles?

R.M.: Eu conheci a Kheira Linder através da minha namorada, elas são amigas! Um dia ela mostrou-me o trabalho da Kheira e gostei imenso, eu mostrei-lhe as primeiras misturas do disco que ela adorou e a partir dai começou a trabalhar na nossa capa. Queríamos um design diferente daquele que era associado aos Norton, e também diferente do que se faz por cá em Portugal, e foi no trabalho dela que encontrámos isso... Foi muito fácil trabalhar com ela, e adorámos o resultado final.

No press release que acompanha o álbum dizem que “o novo disco dos Norton é isso mesmo. Um disco novo”. O que é que querem dizer com isto?

P.A.: O press-release não foi escrito por nós. Quisemos que fosse alguém exterior a banda a fazê-lo. Alguém que conseguisse ouvir o disco com pés e cabeça e que soubesse escrever sobre ele. De qualquer forma penso que isso quer dizer que, há uma identidade musical que foi criada. As influências estão lá no disco, mas acima de tudo, há uma sonoridade que é nossa, que nos identifica enquanto banda e, não como, os Norton parecem esta ou aquela banda!

No mesmo press release dizem que este é um álbum de canções novas onde se aplicam conhecimentos e experiências. O que é que os Norton adquiriram nos últimos anos que tenham aplicado neste disco?

P.A.: Precisamente isso, o conhecimento normal de qualquer pessoa que se dedica ao seu trabalho, que gosta daquilo que está a fazer, e que com o tempo o vai fazendo cada vez melhor.

O press release do novo disco surge escrito em inglês, o vosso site também segue essa direcção e até o vosso disco surge totalmente com palavras em inglês. Isso em principio quer dizer que os Norton querem dar o salto lá para fora. É verdade? Se sim, de que formas tencionam fazê-lo?

P.A.: O inglês é hoje em dia língua universal. Da forma como as coisas evoluíram, estarmos a restringir a nossa comunicação e a forma de chegarmos as pessoas apenas em português, era limitarmos os nossos objectivos e a nossa ambição enquanto banda. Obviamente que temos esse sonho e enquanto houver forças vamos lutar por isso. Portugal é um país com um circuito para tocares demasiado pequeno, ao fim de algum tempo começas a repetir os mesmos sítios, as mesmas salas de espectáculos, os mesmos bares... Obviamente que temos os pés bem assentes e sabemos que vingar lá fora não é fácil, mas acreditamos que não é impossível. Neste momento já estamos em conversações com algumas agências de Espanha e Alemanha para fazermos algumas datas nesses países. De resto é continuar a enviar discos para editoras, agências, rádios, revistas, jornais e esperar também ter alguma sorte, que também é precisa!

Como olham para Frames - Remixes & Versions, o disco editado em 2005? Qual é a vossa relação com esse documento?

P.A.: Olhamos para o Frames como mais um motivo de orgulho na nossa curta carreira. Foi uma aposta que fizemos em algum material que fomos reunindo. Fomos convidando aos poucos bandas e artistas, algumas das quais tínhamos já uma relação de amizade, para fazerem remisturas de temas do Pictures, e cada vez que chegava uma nova havia uma grande curiosidade em ouvir como é que cada banda ou artista interpretava as nossas canções. Foi uma experiência interessante e uma nova forma de análise da música que fazemos, transportada para uma pista de dança, por exemplo. Tivemos a oportunidade de editar esse disco e foi o que fizemos.

R.M.: A primeira remistura foi o Nuno Gonçalves dos The Gift que fez e foi a primeira vez que ouvimos um tema nosso ser remisturado, adorámos o resultado e a partir dai começamos a convidar outros músicos para o fazerem... Surgiu o convite de uma editora para por o disco na rua e assim foi... Neste momento já temos duas novas remisturas acabadas do novo disco, uma vem da Alemanha outra de Inglaterra, ainda não sabemos ao certo o que vamos fazer com elas, mas mais cedo ou mais tarde vamos disponibilizá-las.

Como é ser uma banda de indie rock em Portugal? Isto é se se consideram uma…

P.A.: É difícil. É um mercado mais fechado e obviamente mais difícil acederes às grandes massas.

E como é ser uma banda de Castelo Branco? Como olham para a cidade nos dias de hoje?

R.M.: É uma cidade pequena mas que desde sempre teve imensas bandas... Lembro-me que quando comecei a tocar aos 15 anos deviam existir, sem exagero, mais de 20 bandas activas por aqui, o que é imenso para uma cidade como Castelo Branco. O que se passava e ainda se passa é que as bandas muito dificilmente conseguem sair daqui, e duram muito pouco tempo, não há apoios e os sítios para tocar são poucos, é muitas vezes desmotivante para esse tipo de bandas.

Apresentaram mais ou menos recentemente o novo disco no Festival Naked no Porto e em Lisboa. Como correram esses concertos?

P.A.: Correram muito bem. Em geral, os concertos com este novo disco são assumidamente mais fortes a todos os níveis. O público tem aderido aos concertos e este festival foi mais uma prova disso. Neste caso, como eram 5 bandas por noite tivemos de encurtar o nosso set de músicas, não sendo possível mostrarmos o novo disco por inteiro. De qualquer forma, as reacções e críticas em geral foram muito boas.


André Gomes
andregomes@bodyspace.net
17/05/2007