Um dos pratos fortes da bienal Experimenta Design 2003 consistiu na presença de Lee Ranaldo, co-fundador dos Sonic Youth, para uma sessão especial enquadrada no ciclo Designmatography. Ranaldo complementou a exibição de algumas pelÃculas representantes do cinema experimental norte-americano, extraindo da sua guitarra a redoma perfeita para o pleno desfrutar de cada filme.
Nem todas as entrevistas são planeadas, antecipadas, estudadas. Às vezes a hipótese cai-nos nas mãos, e a última coisa que farÃamos ao encontrar Lee Ranaldo, acabado de levantar as malas no aeroporto e de despejar as tralhas no hotel, seria enjeitar a oportunidade de, informalmente, trocar algumas palavras com ele.
Consegues
dizer quantas vezes já estiveste em Portugal?
[pausa
para pensar]...seis? Acho que foram seis. Se não me engano, a primeira
foi em 1993... No ano passado actuei na Gulbenkian, e em... Serralves.
Isso foi suficiente para conhecer alguma coisa?
Lisboa, pelo menos?
Desta
vez estou cá para uma passagem muito breve. Mas sim, desde que cá
cheguei já me deparei com algumas coisas familiares, que recordo de estadias
anteriores. No ano passado estive cá com a minha esposa. Gosto muito
de Lisboa; embora não conheça com profundidade tenho uma impressão
muito, muito positiva. É muito agradável.
Lembras-te do concerto deste ano, dos Sonic Youth,
cá em Lisboa? Foi brilhante, e toda a gente que lá esteve diz
o mesmo.
Sim!!
Viémos à Europa para apenas dois concertos, Barcelona e Lisboa.
Foi mesmo fantástico, uma daquelas noites em que, simplesmente, tudo
corre bem. Sentimos logo que isso tinha acontecido, estávamos com tanto
entusiasmo e desfrutámos tanto que o resultado acabou por reflectir isso
mesmo. É incrível como, depois de quinze ou vinte anos a tocarmos
juntos, continua a acontecer esse tipo de... celebrações! É
muito gratificante. Além do mais, o espaço era belíssimo...
Que estão a fazer os Sonic Youth, neste
momento?
Estamos
a trabalhar no próximo álbum...
Esta pergunta era quase desnecessária,
ou não fossem os Sonic Youth uma das mais prolíficas bandas rock...
[risos]...bem,
é verdade... um álbum em cada ano e meio/dois anos, tem sido esse
o nosso ritmo. E vai manter-se, pois o álbum estará pronto antes
do próximo Verão. À parte disso, todos nós temos
os nossos projectos pessoais e raramente estamos parados. Digamos que trinta
por cento daquilo que cada um de nós faz é para os Sonic Youth.
Depois de Murray Street, que tipo de disco é
legítimo esperar?
É
claro que o próximo disco não será uma cópia do
Murray Street, mas não será uma coisa drasticamente diferente,
até porque não seria ao fim de tanto tempo que definiríamos
a nossa personalidade, o nosso som.
Tenho a impressão que o Murray Street acabou
por ser um pouco subvalorizado por alguma crítica. Como se cada álbum
vosso posterior a 1992 fosse um parente pobre de clássicos como Sister,
Daydream Nation... Alguma vez tiveste esta impressão?
O
Murray Street teve uma aceitação globalmente muito positiva, parece-me.
Agora, acho que acaba por ser normal que as pessoas permaneçam um pouco
“agarradas” aos álbuns que referiste... Já são
muitos álbuns, muitos anos, e é natural que certo momento e certo
disco prendam a preferência de cada pessoa.
O Murray Street é, decididamente,
um dos meus preferidos. Parece-me um disco sólido e uno como há
muito não conseguiam fazer...
Hmm...
Sim, concordo.
E o Jim O’Rourke terá algo a ver
com isso, não?
Claro,
a partir do momento em que ele passa a ser, plenamente, um membro do grupo, aquilo
que nós fazemos tem o dedo dele. Tem uma parte dele, tal como tem uma
parte de todos os outros. Penso, essencialmente, que o disco é o fruto
de um bom trabalho, de um trabalho unido e inspirado.
E
o Lee Ranaldo, individualmente, tem-se dedicado a quê?
Neste
momento tenho um livro de poesia prestes a ser lançado... Tenho trabalhado
com de tudo um pouco, tentando explorar o máximo possível várias
vertentes distintas e compatibilizando-as, mesclando-as em algo concreto. Música,
escultura, vídeo... [pausa] Ah! E tenho jogado ténis! [risos]
As
actuações acabam por transparecer essa tua vertente exploradora?
Ou seja, todas essas ocupações têm uma correspondência
directa naquilo que fazes em palco?
Sim,
acontece. Também no que toca às actuações, não
existe um padrão fixo e estabelecido... ou melhor, existem vários.
Spoken word... improvisação... por exemplo, naquela ocasião
em que estive na Gulbenkian toquei com o Rafael Toral. A minha esposa costuma
acompanhar-me, também...
Amanhã vais improvisar sobre alguns filmes.
Conhece-los bem, tens um projecto daquilo que farás?
Sim.
Tenho uma ideia mental suficientemente definida de como será... das ligações,
da abordagem aos momentos chave e de como complementar. Ou seja... improvisado,
mas nem tanto... [risos]