ENTREVISTAS
The Young Mothers
Noruega, Texas
· 26 Jul 2015 · 20:40 ·
O contrabaixista Ingebrigt Håker Flaten já não é apenas uma das grandes forças criativas do jazz nórdico. Oriundo da Noruega, membro de grupos fundamentais como The Thing, Atomic e Crimetime Orchestra, Håker Flaten vai construindo um curriculum vastíssimo. De uma discografia enorme, não só se destacam os grupos citados, como será também relevante realçar os seus registos em duo com dois gigantes, Joe McPhee e Evan Parker. Nos últimos anos o baixista e contrabaixista aventurou-se na América: já morou em Chicago, onde juntou o seu Chicago Sextet (que também já passou pelo Jazz em Agosto), e agora a residir em Austin (Texas), criou um novo grupo, The Young Mothers. O disco de estreia, A mothers work is never done (Tektite Records), foi editado em Março de 2014 e revela uma música promíscua onde o jazz e a improvisação se cruzam sem receios com o rock e o hip-hop. Antecipando a apresentação ao vivo dos The Young Mothers no Jazz em Agosto, Ingebrigt Håker Flaten apresenta-nos este projecto original onde o jazz não morre solteiro.
© © Peter Gannushkin
Porque escolheu chamar ao seu novo grupo The Young Mothers?

A minha mulher integra uma organização comunitária ligada às artes e à cultura de Houston, que promoveu um projecto que convidava jovens mães com dificuldades a participar numa iniciativa que lhes dava acesso a alojamento gratuito. O projecto inspirou-me e o nome surgiu a partir disto. Claro que, sendo um grupo que junta músicos “mauzões” do underground, o nome poderá ter outras conotações.

Um dos aspectos mais originais deste grupo é a inclusão de elementos hip-hop. Como juntou e reuniu os diversos elementos musicais que constituem o som do grupo?

O som da banda é baseado na união de todas as influências dos membros, na junção de todas as suas origens estilísticas. O Jawwaad Taylor [voz e trompete] tem um passado ligado às comunidades do hip-hop de Houston e de Nova Iorque, por isso o elemento hip-hop acaba por lá estar também.

Qual a sua relação com o hip-hop? Costuma ouvir hip-hop em casa?

Nunca ouvi muito hip-hop, mas sempre gostei das batidas, sempre gostei de brincar com essas batidas na “drum machine”. E é claro que artistas como Public Enemy, A Tribe Called Quest e MF Doom têm estado nas minhas playlists! Depois de ter conhecido o Jawwaad fui apresentado a vários projectos da cena de Houston e a verdade é que tem sido muito interessante explorar esta cena musical. Vou apresentar alguns desses músicos num festival que estou a organizar em Austin em Setembro, chamado Sonic Transmissions.

Além do hip-hop, quais são os outros elementos que se misturam na música deste grupo?

O Stefan [González] vem de um passado ligado ao metal e ao grindcore e o Jonathan [Horne] esteve ligado ao punk rock, por isso esses elementos estarão muito presentes na música da banda. Também quero incorporar alguns elementos afrobeat e também pop, desde que eles fluam de forma natural. O Jason [Jackson, saxofones] toca numa banda de afrobeat e tem-me ajudado muito nisto, sobretudo nos arranjos de sopros.



Por vezes a música dos The Young Mothers soa próxima dos Rage Against The Machine. A vossa música tem alguma mensagem interventiva, política e social?

Não quero ter um papel político mas, ao mesmo tempo, ao viver num país como os Estados Unidos, é difícil não o ter, por causa daquilo que vemos todos os dias: a injustiça, a pobreza, desigualdade… Eu acredito que a música é uma das formas mais fortes de unir as pessoas e fazê-las entender que é necessário trabalhar em conjunto ara resolver o problema. Talvez seja ingénuo da minha parte, mas eu tenho esperança que a minha música possa produzir alguma mudança nas pessoas e, consequentemente, possa ter uma certa mensagem política e social… mas sem tomar partidos.

Neste grupo toca com Jawwaad Taylor [voz e trompete], Jason Jackson [saxofones], Jonathan Horne [guitarra], Stefan Gonzalez [vibrafone, bateria] e Frank Rosaly [bateria]. Porque escolheu juntar estes músicos?

Fiquei a conhecer todos os músicos através de amigos em comum das comunidades musicais underground do Texas. Primeiro, conheci algumas pessoas das primeiras vezes que fui lá tocar. Depois, comecei a conhecer mais pessoas quando me mudei para lá, em 2008. Pareceu-me muito natural e completamente lógico ter estes músicos fantásticos juntos, apesar de oriundos de universos e estilos musicais distintos. E o Frank tem sido um dos meus maiores amigos e dos meus bateristas favoritos há muitos anos, por isso foi também uma escolha natural.

Sabe que há uma banda chamada Young Fathers? Estaria disposto a fazer uma parceria musical com eles?

Ahaha! Não os conheço, nunca ouvi, nem nunca pensei nisso… Vou investigar!



Mudou-se da Noruega para os Estados Unidos, primeiro Chicago, depois Austin, Texas. A par destas mudanças, o que terá mudado na sua música?

Continuo a fazer aquilo que sempre fiz, mas acredito que a minha música possa ter sido afectada pela urgência da vida americana, de uma forma positiva. Eu continuo a estar muito feliz pelas minhas ligações europeias e norueguesas, por isso até agora tem sido uma boa combinação… mas também é um grande desafio!

Já tocou várias vezes no festival Jazz em Agosto, com as bandas The Thing, Atomic, Crimetime Orchestra e o seu Chicago Sextet. O que é que este festival representa para si?

O Jazz em Agosto é sem dúvida um dos festivais mais porreiros da Europa! Adoro o festival, o sítio, a música, as pessoas, a comida!

Já gravou vários discos com a editora portuguesa Clean Feed. Sente uma ligação especial com Lisboa e Portugal?

Sim, sinto uma ligação especial com Portugal… Como já disse, adoro as pessoas e a cultura, para mim é muito familiar! E, claro, o Pedro Costa sempre foi um grande amigo e é uma figura muito importante na música internacional experimental. Estou muito contente por conhecê-lo e por conhecer muita gente ligada à Clean Feed, tem sido muito importante para mim.

O que poderemos esperar da sua actuação de The Young Mothers no Jazz em Agosto?

Nós iremos dar todos o nosso absoluto melhor, de forma a darmos um grande concerto. Vamos tocar algum material novo, estamos muito entusiasmados para tocar no festival, toda a gente está ansiosa para lá ir!
Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com

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