ENTREVISTAS
Capicua
Sem segundas intenções
· 27 Mar 2014 · 00:03 ·
© Pedro Geraldes
Capicua é Ana. E Ana é Capicua. Do Porto, meteu-se no hip-hop ainda na adolescência, aos 15 anos, através da prática de graffiti em grupo, na sua crew: UCA. Na música começa em 2004, com Mc militante, e edita dois Ep’s em grupo, Syzygy em 2006 e Mau Feitio em 2007. A solo, lança a mixtape Capicua goes Preemo. Em 2013, e depois de várias colaborações, lança o primeiro álbum, homónimo que arrecada lugares cimeiros nos top’s anuais da imprensa especializada. Em 2013 lançou mais uma mixtape, desta feita com beats do Kanye West, Capicua goes West. Neste mês de Março de 2014, Capicua lançou o seu novo álbum pela editora Norte Sul, intitulado Sereia Louca e que já roda nas rádios nacionais. Capicua apresenta o seu novo disco no próximo sábado no Plano B (Porto) e no Musicbox (Lisboa) no dia 5 de Abril.
O que mudou desde o início até agora, ao lançamento do segundo álbum?
 
Ganhei experiência e maturidade enquanto rapper. Cheguei a um público mais alargado e angariei mais atenção para aquilo que faço musicalmente. O que me trouxe muitas oportunidades de concertos, colaborações interessantes com outros músicos e até mais possibilidades de profissionalizar a minha actividade.
 
Capicua do dominó ou dos números? Porquê?
 
Capicua porque me chamo Ana.
 
Recorrendo a uma analogia com o jogo de tabuleiro, faz parte dos teus ideais destruir as fileiras sociais?
 
Não sei bem o que é isso de “destruir fileiras sociais”. Mas se estás a falar das minhas ideias políticas, posso dizer que tenho uma agenda de preocupações sociais que é transversal às minhas letras. Gosto de fazer pensar e de usar a música para questionar a realidade que nos rodeia. Sinto essa responsabilidade.
 
Li algures que começaste no hip-hop pelo graffiti... Já foste writter? Conta-nos isso um pouco melhor.
 
Comecei a fazer Graffiti aos 15 anos e foi esse o meu primeiro contacto com o Hip Hop. Foi por esse interesse que comecei a frequentar festas e concertos de Rap e a construir o meu grupo de amigos dentro da cultura.
Pintava no Porto e a minha crew chamava-se UCA. Com o passar dos anos, fui ganhando interesse pelo Rap e o Graffiti foi ficando para trás.
 
Como vês a relação da cidade, da autarquia e dos writters portuenses com a arte urbana?
 
Os writers têm feito a sua parte com empenho e sempre na resistência. A autarquia reprime ou promove a arte urbana consoante os interesses e as modas, em busca de aproveitamento populista. Os media exploram esta relação... É o normal.

© Miguel Refresco
 
Na biografia do teu site oficial pode ler-se que és MC militante. O que entendes por MC militante?

O Rap exige muita dedicação. Quando digo “Mc militante” quero dizer que me dedico ao rap intensamente, levando-o muito a sério. Como uma missão.
 
Fizeste parte da Syzygy, grupo de hip-hop feminino que há uns anos conseguiram algum relevo na cena portuense e mesmo nortenha. O que guardas dessas e outras experiências em grupo?
 
Guardo saudades. Foi uma parte muito importante do meu crescimento musical e até hoje mantenho a M7 e o D-One comigo no palco!
 
No que respeita à produção de Sereia Louca, continuas a depositar essa responsabilidade noutras pessoas? O que se alterou nos procedimentos de trabalho do primeiro disco para este?
 
A principal alteração é que este disco tem uma parte acústica (feita de versões de temas de trabalhos anteriores) e, portanto, uma boa parte das músicas nasceu no palco, com instrumentos e na colaboração com o Mistah Isaac e os They’re Heading West.
 
Neste último trabalho, optaste por convidar alguém para partilhar o cargo das vozes?
 
Tenho três convidadas especiais! A M7 que entra no tema “Mão Pesada”, a Gisela João (no refrão da “Soldadinho”), com quem já tinha colaborado quando escrevi uma letra para o álbum dela e, finalmente, a Aline Frazão, que tem um talento incrível e que canta um poema de José Gomes Ferreira no refrão do “Lupa”!

© Miguel Refresco
 
És tão eclética na escolha de sonoridades, quanto nas temáticas que abordas através das letras. Em certa medida, sinto que abriste a porta do hip-hop a um outro tipo de sensibilidade e preocupações. Concordas?
 
Eu acho que o Rap é habitualmente muito aberto a misturas e muito diverso nas temáticas, mas como há um grande desconhecimento da imensa variedade de estilos e rappers que cabem na cena nacional, acabam por achar que sou uma espécie de excepção! Não me reconheço nessa qualidade e acho que sou mais um dos “pantones” no imenso arco-íris que compõe o nosso Rap.
 
A tua entrada no panorama nacional de música portuguesa colocou em crise dois dos mais impregnados preconceitos formados acerca dos grupos hip-hop: és mulher e és doutorada. Havia esta intenção de emancipação em prol da igualdade?
 
Eu sou o que sou, por isso não pode haver intenção por detrás da minha identidade! Faço Rap porque é o que mais gosto de fazer! Agora, acho que indirectamente, posso contagiar algumas pessoas pelo exemplo, inspirando pela identificação, como fazem todos os rappers. E se puder inspirar outras mulheres, tanto melhor!
Alexandra João Martins
alexandrajoaomartins@gmail.com
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