ENTREVISTAS
Chelsea Wolfe
A pain that I´m used to
· 23 Out 2013 · 00:30 ·
© Anna Dobos
Esta entrevista foi feita ainda antes de Chelsea Wolfe subir ao palco principal do Hard Club, durante o Amplifest 2013 (por duas vezes, até, primeiro num concerto arrebatador a solo e depois fazendo companhia aos Russian Circles). Se as perguntas que aqui se encontram ainda vinham na ressaca da audição de Pain Is Beauty, disco prenhe de emoções fortes e letras, porque não dizê-lo, demasiado cruéis para com certos e determinados estados de espírito, depois disso deveríamos ter-lhe perguntado: porque insistes em destruir-nos, Chelsea Wolfe? Em quatro anos a norte-americana tornou-se ponto de passagem obrigatório para quem se deseja afundar um pouco mais no abismo por intermédio da canção, ou canções, belas no seu negrume e essenciais por isso. A loba em discurso directo ao Bodyspace.
O Pain Is Beauty tem uma veia electrónica mais pronunciada do que os seus antecessores. Que impulsionou este abandonar das guitarras?

Não é um abandonar, de todo. O meu colega Ben e eu começámos a compor canções electrónicas há alguns anos, até antes de sair o álbum acústico, e acabámos eventualmente por incorporá-las nos concertos. Gostei de as cantar ao vivo e quando surgiu a altura de começar a fazer um disco novo quis incluir algumas delas. Claro que nunca me consigno a um só género musical, por isso também há canções com guitarras, ao piano, e por aí fora.

Esse lado electrónico torna mais difícil colocar estas canções num contexto de concerto? Consegues distinguir claramente entre aquilo que é gravado e aquilo que é tocado ao vivo, isto é, o que gravas é uma coisa mas num palco outra completamente diferente?

Tivemos um par de meses, no verão passado, para poder trabalhar nas canções novas. Há elementos electrónicos e, ao vivo, elementos com instrumentos, e tentámos juntá-los de uma forma que fosse emocionalmente dinâmica ao vivo.

© Zohn Mandel

Queres explicar este título? Como pode exactamente a dor ser bela? Considerarias que este é o álbum perfeito para o mundo das Cinquenta Sombras de Grey?

Não li o livro. Pain Is Beauty é uma metáfora para a cura e a superação. Muito do álbum é inspirado pelo negrume e intensidade da natureza. Andei a ler sobre incêndios florestais e o processo regenerativo do fogo, que cria espaço para novos crescimentos no solo da floresta. Este processo também se reflecte na humanidade. Caminhamos através do fogo - os tempos difíceis que a vida nos traz - e temos de escolher entre desistir ou lutar e sair pelo outro lado, mais fortes e com uma perspectiva mais bela, mais clara. Este disco é sobre isso: a luta pela superação.

Como foi o processo criativo deste disco? Houve uma influência maior dos teus colaboradores, como o Ben Chisholm, na escrita?

Normalmente escrevo e trabalho sozinha, e o Ben é uma das primeiras pessoas com as quais me senti confortável a escrever ao longo dos anos. Continuo a começar uma canção sozinha, na maior parte das vezes, mas o Ben e eu somos capazes de colaborar de uma maneira que junta as nossas próprias mentes criativas.

Muito se tem escrito das tuas influências musicais, mas quais são as tuas influências em termos de letras? Que tens andado a ler?

Li o 1Q84 no ano passado e gostei da atenção aos detalhes. Não sei ainda se me inspirou em termos de escrita. Mas, geralmente, os livros fazem-no: os do D.H. Lawrence inspiraram-me muito. E os documentários do Werner Herzog inspiram-me constantemente.

Tens editado um disco por ano desde 2010. Já estás a trabalhar no sucessor do Pain Is Beauty?

Provavelmente.

© Kristin Cofer

Em muitas entrevistas, mencionas o quão tocar ao vivo ainda é uma tarefa difícil. O que é que normalmente fazes antes de um concerto para ocultar as inibições? Tentas distanciar-te da audiência o mais possível quando tocas?

Descobri que vestir-me de determinada forma ajuda porque me dá uma coisa na qual me posso focar antes do espectáculo e ajuda a sentir-me fortalecida. A moda está naturalmente alinhada com a música, de qualquer das formas, e acho que é importante fazê-lo para um trabalho destes. Costumava simplesmente usar um véu e vestir-me toda de preto, a tentar tornar-me invisível, mas tive de me afastar disso. Conheci uma estilista - a Jenni Hensler - com quem ainda trabalho, e ela ajuda-me a encontrar designers com os quais consiga uma ligação e também me confecciona algumas peças a pedido para concertos e tournées. Uma em particular com a qual me entendi à partida foi a OVATE. Também gosto da Ann Demeulemeester e da Margiela. A moda torna uma mulher mais forte.

O Mistake In Parting está perdido para sempre no tempo ou haverá hipótese dessas canções voltarem a ser ouvidas?

Para mim está. Deitei uma caixa de 250 CDs para o lixo há anos e apaguei-o de todo e qualquer computador que tinha. Anda por aí pela Internet, infelizmente. Não estava preparada para lançar música nessa altura [2006], e foi uma experiência mal conduzida. Eram tempos diferentes. Algumas pessoas nunca mudam por isso parece-lhes estranho fazer algo como isto, mas eu mudei muito ao longo dos anos e estou constantemente a mudar para algo novo, não me parece estranho desonrar algo que me traz memórias negativas.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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