ENTREVISTAS
Torres
Torre de Batalhas
· 29 Mai 2013 · 01:29 ·
© Gavin Thomas
Torres. Um nome tão familiar para quem fala a língua portuguesa, como desconhecido para a maior parte dos melómanos. Torres, ou o pseudónimo pelo qual a americana Mackenzie Scott escolheu apresentar-se ao mundo. E ao qual, no seu álbum homónimo de estreia, ofereceu uma série de canções memoráveis, e repletas de uma beleza descarnada a golpes de voz e guitarra eléctrica, dignas da herança deixada por outros grandes nomes como Nina Nastasia ou Shannon Wright. Torres tem a mesma capacidade de fazer as suas canções crescerem até ficarmos totalmente envolvidos por elas, e vibrarmos com cada novo acorde. O Bodyspace teve a honra de trocar emails com a nativa de Nashville. Conversação reproduzida a seguir.
- Em primeiro lugar, como e porquê é que Mackenzie Scott se tornou Torres? Nasceu a Torres num “campo de batalha sangrento”, como dizem as primeiras palavras do álbum?

Decidi adoptar o nome Torres como alcunha no último Verão, quando estava a gravar o álbum. Era o apelido do meu avô, e queria tomá-lo para mim própria, com propósitos criativos. Não nascemos todos em campos de batalha sangrentos?

Sente que é mais importante usar a electricidade, ao invés da guitarra acústica mais típica, de forma a transmitir as mensagens nas suas canções e letras?

Acho que a mensagem teria sido transmitida com igual eficácia com uma guitarra acústica, mas esta não é tão diversa como uma guitarra eléctrica. Acho que o disco beneficia da energia e dinâmica da eléctrica.



Apesar da presença nítida da guitarra eléctrica, as suas canções não parecem ter muitas notas ou acordes nelas. Sente que adicionar coisas mais complexas ao seu desempenho na guitarra iria prejudicar a força inerente às canções?

Não tenho certeza. Suponho que irei descobrir quando escrever o próximo disco. Não penso necessariamente que isso iria prejudicar. Seria apenas diferente.

As suas canções têm uma duração que muitas vezes passa os 5 minutos. Como a “November Baby” que dura mais do que 7. Foi um processo natural, ou sentiu desde o princípio que as canções exigiam esta estrutura?

Não estou certa o que se passa na maneira como escrevo canções, mas elas inevitavelmente acabam por ter mais do que 5 minutos de duração. Acho que as canções neste disco tinham simplesmente muitas palavras. E quando há muitas palavras as canções têm que ser compridas.

Conseguiu, na minha opinião, que a sua voz e melodias se mantivessem como ponto fulcral das suas canções. Era importante para si ser ouvida de forma clara no meio do “barulho” restante?

Sim. Era a coisa mais importante de todas ter a certeza de que a minha voz era ouvida. As letras são a parte mais importante do disco, e queria ter a certeza que elas eram perceptíveis na mistura.

© Will Holland

Nas suas actuações disponíveis online, vemo-la normalmente sozinha com a guitarra. Mas canções como “Chains” incluem sintetizadores e pulsares electrónicos. Sentiu que esta diversidade ajudaria a dar uma nova dimensão ao sentimento geral do álbum?

Penso que sim. “Chains” foi uma experiência para mim. É definitivamente a que está mais distante do resto das canções do álbum. Não tinha certeza de como iria ser recebida, porque é mesmo tão inesperada. Mas as pessoas parecem estar a responder na sua maioria positivamente à canção.

Daquilo que tenho visto das suas actuações ao vivo, a sua interpretação das músicas é bastante intensa. Do tipo que prende fortemente a atenção de uma plateia. É isto algo que espera atingir? Sente que o público a “acompanha” durante a viagem das canções?

Essa é sempre a minha esperança. Sempre achei que as actuações ao vivo devem trazer uma dimensão e energia totalmente novas às canções que as gravações simplesmente não conseguem. Quero que as plateias sintam que estão mesmo lá comigo. O que quer que “lá” signifique.

A maneira como cria uma série de ganchos melódicos com o que parecem ser meios minimalistas lembra-me muito o que o Bill Callahan faz nas suas canções. Procurou conscientemente evitar quaisquer floreados desnecessários. Acha que algum género específico de música poderia passar sem eles?

Isso foi uma escolha consciente, sim. Queria que as canções fossem capazes de sobreviver por si só. Quer esteja a tocar com uma banda inteira, ou se as estiver a tocar sozinha com a minha guitarra. Sempre pensei que as melhores canções incorporam essa qualidade. Se uma canção é boa, não precisa de enchimentos.

Não pude evitar anotar letras de praticamente todas as canções. No meio de toda a imagética forte, uma que me vem sobretudo à cabeça é a pessoa que deseja não ter saltado na “Waterfall”. Sente-se confortável a cantar estas letras ao vivo? Alguma vez se torna demasiado difícil, ou é relativamente fácil entrar na personagem?

Não há personagem. É tudo eu. Divirto-me muito a cantar essa canção ao vivo, na verdade. Gosto de ver a cara das pessoas enquanto tentam perceber se estou ou não a cantar sobre suicídio. Gosto de abordar um tema que ninguém gosta de confrontar. Acho que o põe mais à vista, e torna-o mais aproximável. Gosto de mostrar às pessoas que, se estão a lutar e a sofrer, não estão sozinhas.

© Bekah Cope

O seu album foi auto-editado. Esperava receber o tipo de atenção que tem recebido? Qual foi a maior recompensa que isto lhe trouxe até agora?

Mesmo nada. Estou tão surpreendida como qualquer outro. Talvez até mais. Desde que o disco foi editado, conheci muitas pessoas que admiro e respeito. Abriu, definitivamente, muitas portas.

Um instrumento que aparece em muitas das suas canções é o violoncelo. O que havia nas canções que, na sua mente, pedisse a sua presença nos arranjos?

O violoncelo é o meu instrument favorite. Alguém me disse uma vez, que o violoncelo é o instrumento que mais se assemelha à voz humana. Assombra-me. As canções deste disco emparelham perfeitamente com o violoncelo, acho eu. Tráz humanidade, escuridão e calor, todos ao mesmo tempo.

Por último, gostaria de saber qual destes preferirias: tocar guitarra para um cantor que admirasse? Ou cantar para um guitarrista que admirasse?

Preferia cantar para um guitarrista que admirasse. Ficaria muito embaraçada a tocar guitarra diante de um cantor que admirasse...Não sou uma grande guitarrista. Estou a praticar para ficar melhor, ainda assim.
Nuno Proença
nunoproenca@gmail.com
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