DISCOS
ATILLLA
V
· 03 Fev 2015 · 22:11 ·
ATILLLA
V
2015
Bisnaga Records


Sítios oficiais:
- ATILLLA
- Bisnaga Records
ATILLLA
V
2015
Bisnaga Records


Sítios oficiais:
- ATILLLA
- Bisnaga Records
Pensamentos negros.
Não é de agora que Miguel Béco de Almeida dá cartas na elaboração de malhas com forte pendor industrial e ambiência negra, resgatando influências tanto ao black metal mais puro como ao techno psicologicamente denso. Ouçam-se os seus registos anteriores enquanto ∆TILLL∆, enumerados de I a IV, e neles encontramos as blueprints que formam este seu quinto disco sob essa designação. Mas, em V, Miguel Béco dá um salto qualitativo gigantesco; a sonoridade roufenha e as experiências caseiras dos discos antigos dão lugar a um trabalho muito mais cuidadoso e cauteloso, o texto final de uma tese que demorou anos a ser escrita e que foi sofrendo cortes e alterações.

V é, por isso o som definitivo de ∆TILLL∆. Dividido em oito faixas com títulos cadavéricos, é um disco que permite pouco a respiração: o peso electrónico abate-se sobre nós, o ritmo vai alterando a velocidade tal qual antecede a aproximação de algo de muito maquiavélico. "Acreção", primeiro tema, é disto exemplo, sendo o maquiavelismo da coisa o sintetizador que dispara uma melodia tenebrosa e repetitiva, antes do noise de "Carne" nos fazer disparar os sentidos - qualquer coisa atrás de nós, a perseguir-nos, bafo sujo de sangue e vontade de truculência. É um disco gerador de imagens fortes na mente de cada um, que fará o seu próprio filme de terror consoante o seu gosto. Não pode é negar o terror.

E aqui, o terror surge sobretudo quando a voz acontece límpida pela primeira e única vez no assombroso catálogo de ∆TILLL∆, e logo vinda de uma das melhores gargantas - e mãos escrevinhadoras de poemas - aparecidas em Portugal na segunda década do milénio. Falamos de um dos dois corpos dos Ermo, António Costa, que aqui interpreta na perfeição o terror psicológico de não se saber o que fazer à vida, aliando-se ao lamaçal electrónico na mesma medida em que um e um são dois e "Carne" + "Alma" geram, claro está, o "Homem". E se nada faz sentido, oh mãe? E se amor não é amar?...

V é em todas as medidas um disco tremendo, o novo degrau na escala evolutiva de um músico que tem sabido esculpir o seu som com o tempo, e que soube definitivamente moldar em obra o crescimento natural que sofreu enquanto artista e enquanto pessoa. Não o desmentem estas canções, e para além das supracitadas também o registo dançável de "Ritos Fúnebres" (na mesma medida em que Ben Frost utilizou ritmos mais apontados às pistas em A U R O R A) merece destaque. Voltaremos cá inúmeras vezes ao longo dos próximos anos, certamente. Porque V é o retrato máximo de um projecto que tem mostrado ser absolutamente vital neste campo da electrónica pesada. E porque a morte lenta e dolorosa a que assistimos ao longo destas oito canções até ao "Colapso" final nos assenta tão bem.
Paulo CecĂ­lio
pauloandrececilio@gmail.com
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