DISCOS
The Meeting Places
Find yourself along the Way
· 02 Jan 2004 · 08:00 ·
The Meeting Places
Find yourself along the Way
2003
Words On Music


Sítios oficiais:
- The Meeting Places
- Words On Music
The Meeting Places
Find yourself along the Way
2003
Words On Music


Sítios oficiais:
- The Meeting Places
- Words On Music
Desesperem aqueles que, há anos, desejam a morte à guitarra eléctrica. Desesperem porque por maior que seja a sua esperança em viver em paz, à margem dos ciclos nos quais a electricidade retorna em força, estes senhores terão, mais tarde ou mais cedo, quando se julgarem livres desta, de se confrontarem com uma guitarra distorcida à porta, no elevador, no andar de cima, no andar de baixo ou até mesmo na garagem.

Num momento da música popular em que meio mundo parecia rendido às electrónicas (desde o trip-hop ao revivalismo do electro-pop) e farto do rock (do grunge ao brit-pop, passando pelo pós-grunge), o universo acordou, de repente, para uma manifestação de longos kms de guitarras eléctricas sedentas por se fazerem ouvir. Na rua, de repente, o rock fez-se ouvir de novo, nas suas mais diversas facetas: no seu convívio com a electrónica (Notwist e Lali Puna), com as culturas tecno, funk e house (Radio 4 e The Rapture), no seu estado puro e duro (The Strokes, White Stripes, Yeah Yeah Yeahs, Hot Hot Heat) e na sua mistura com a arte (GYBE, Mogwai e Sigur Rós) ou com o futuro (Trans Am e Tortoise). Esta «re-(...)-revolução» aconteceu em pouco mais de meia dúzia de anos. Daqui a mais uma meia dúzia de anos, a guitarra regresará à garagem, mas, mais tarde ou mais cedo, voltará para causar estragos. Pelo menos é assim que as coisas são desde o tempo em que o mundo se lembra de ouvir o som estridente de uma guitarra eléctrica.

Serve esta lengalenga introdutória para dizer que bandas «noise rock» e «dream pop» - devotas dos Sonic Youth, dos My Bloody Valentine, dos Slowdive ou dos Ride e do rock de guitarras distorcidas e tingidas com limão - jamais se extinguirão. Haverá sempre alguém desejoso de derramar arte suja sobre uma guitarra punk ou alguém a pensar que o sabe fazer, mesmo não o sabendo.

Find Yourself Along the Way, o primeiro tomo dos Meeting Places – um quarteto oriundo de Los Angeles, formado no ano 2001, por Arthur Chan (baixo), Chase Harris (guitarra e voz), Scott Mcdonald (guitarra) e Dean Yoshihara (bateria) - surge, neste contexto, como um álbum que anuncia ao mundo um projecto a meio caminho entre o fascínio por estes heróis da guitarra eléctrica e a impotência de criar algo de novo num universo com tendências para a circularidade. Se poucas dúvidas há de que paira no ar uma sensação de no future para as fórmulas e visões originais mas saturadas de bandas como os Sigur Rós, os Mogwai e os GYBE para esta faceta muito particular do rock, álbuns como este só vêm reforçar essa mesma ideia, apesar de nos encontrarmos em paisagens um pouco mais pop – com recursos habituais ao formato «canção», geralmente descurado pelos projectos supracitados.

Produzido por Aaron Espinoza (que desempenhou as mesmas funções em álbuns de gente como Elliott Smith, The Breeders e Folk Implosion), Find Yourself Along the Way é, essencialmente, um álbum de quatro devotos de uma tradição que os Meeting Places, por enquanto, não parecem querer ousar deixar para trás. Grande parte das frágeis – porque pouco personalizadas – composições que percorrem os quarenta e um minutos do álbum não acrescenta uma única novidade ao que os My Bloody Valentine ou os Jesus & Mary Chain andaram a experimentar há mais de dez anos atrás. Basta escutar a faixa de abertura - «Freeze our stares» - para compreender para o que vêm os Meeting Places: não para explorar novos locais ou ambientes, mas para nos recordarem locais ou ambientes aparentemente adormecidos. Se prestarmos alguma atenção às palavras de Harris, damo-nos de conta, em poucos segundos, de que é o sonho que comanda as guitarras e as palavras destes rapazes («you know I dream too/now that time has gone on/everything is forgotten you know I lie too, I lie too» em «See through you»). «On your own» é tão My Bloody Valentine quanto o calmante «See Through You» é Jesus & Mary Chain. E o sonho está lá sempre...

O mais desconfortável na audição de Find Yourself Along the Way é precisamente sentir constantemente que o que escutamos aqui é demasiadamente igual na sua estrutura e nas referências que evoca para ser verdade. Nem o mais interessante «Take To The Sun» - tão ruidoso quanto ácido e arrastado - se escapa à reminiscência da obra dos Spiritualized.

Não sendo um projecto totalmente desarrojado e apesar das parcas novidades, este primeiro tomo dos Meeting Places deverá ser tomado como um objecto de tributo (cumpridor no propósito) e de primeira experiência. Afinal, o bebé tem pouco mais de dois anos. Deixemo-lo crescer e chegar à fase da independência...

Ah! E continuem a desesperar aqueles que sonham há anos com a extinção da guitarra eléctrica...
Tiago Carvalho
tcarvalho@esec.pt

Parceiros