DISCOS
Bola
Fyuti
· 09 Dez 2002 · 08:00 ·
Bola
Fyuti
2001
Skam


Sítios oficiais:
- Bola
- Skam
Bola
Fyuti
2001
Skam


Sítios oficiais:
- Bola
- Skam
Bola, aka Darrell Fitton e abreviatura/trocadilho do estranho “bowl of yew tea”, é um nome tão importante no contexto da electrónica dos anos 90 como os conterrâneos Aphex Twin, Autechre ou u-Ziq, aproximando-se esteticamente deste último. Bola é, efectivamente, um projecto muito mais próximo da reflexão e contemplação do que do barroquismo de bleeps que povoam os sons da IDM. Mais do que u-Ziq, Darrell Fitton é um puzzle de peças vindas maioritariamente da música ambiental quase new age. Por sinal, fez lembrar ao meu pai os tempos áureos de Jean Michel Jarre, sendo que, no entanto, existe notoriamente uma adaptação aos anos 90 e o desaparecimento de qualquer vestígio dos épicos quase naif de Jarre, Vangelis ou Tangerine Dream. Em “Fyuti” os sons são marcadamente nocturnos e obscuros, construindo atmosferas frequentemente inquientantes, e escurecendo à medida que os temas vão passando. No entanto, este “nocturno” deriva talvez do sentimento de viagem que se apodera de nós logo no início, com “Vertiphon”. O baixo ecoa no nosso cérebro, levitando-o com a ajuda dos muito etéreos sintetizadores, que percorrem todo o álbum. “Fyuti” contém momentos de pura claustrofobia e outros extremamente “hauting” , mas em todos eles sentimos os samples a ecoarem, cortantes, por entre a “spaciousness” que é o sentimento predominante no álbum.

Não se pode chamar a “Fyuti” um álbum pessoal, e muito menos imediato. Demora a absorver a proposta de Darrell Fitton, muito provavelmente devido a um sabor amargo que, de música para música, filtra a nossa percepção dos sons. É essa despersonalização que se encontra, exemplificando, em “Pae Paoe” ou “Horizophon”, onde os beats complexos, de tão cliche, dando previsivelmente lugar quer a sintetizadores quer a uma melodia de piano minimal, são já parte de qualquer compêndio de música “inteligente”.

Desta fórmula mais ou menos pré-concebida emerge um som construído por wobbles and bleeps, por sintetizadores que fazem lembrar, por vezes, os “Ambient Works” de Richard D. James, por melodias simples e interessantes – de tão tensas e ambíguas -, enfim, um ponto de partida comum à esmagadora maioria das propostas desta corrente estética. O desafio está em criar, a partir de um leque sonoro relativamente curto (e simultaneamente infinito – a música electrónica) um conjunto de músicas coerente, e que fuja aos pressupostos da IDM, que começam progressivamente a cansar – os samples curtos, a dissonância, a agressividade, a não-linearidade; desafio esse que “Fyuti” consegue ultrapassar frequentemente – há excepções. No entanto, quando se ouve “Magnasushi”, por exemplo (e a melodia faz tanto lembrar “Autumn Leaves”), não se pode deixar de sentir o poder imenso dos laptops, e o grau de refinamento e sofisticação a que chegaram os laptop musicians.

Falta agora o desafio último. À electrónica a que chamam de cerebral e inteligente, falta ainda o território da profundidade melódica, da verdadeira fusão com o passado orgânico. E nota-se em Fitton uma tentativa de tentar aliar a identidade noir e a abstracção inerente às suas composições a uma certa sensibilidade Jazz (se é que se pode chamar assim a alguns excertos de “Fyuti” mais interessantes do ponto de vista melódico e rítmico). É nítida, pelo menos, o transporte de uma mensagem, esculpida habilidosamente nas melodias de “Veronex Chyper”, principalmente. A mensagem é um “overflow” de ideias em suspensão, ideias para a construção da estética do novo milénio, assente num cepticismo que transcende a música para influenciar o ouvinte.
Nuno Cruz

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