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Ozzy Osbourne / Judas Priest
Altice Arena, Lisboa
/07/2018


A partir de que idade deixa de ser aceitável ter uma grande estrela rock em palco, a apresentar os seus velhos êxitos perante uma plateia que não ouve nem ouvirá nada mais para além daquilo que já conhece? Se perguntarem ao público que marcou presença na Altice Arena, será sempre aceitável porque, afinal de contas, os putos de hoje em dia só ouvem merda. Se perguntarem a Ozzy Osbourne, ele dir-vos-à que enquanto houver força e fãs ele ali estará para os entreter, mesmo que já ande arrastado e agachado, por culpa da idade e das drogas. Se perguntarem aos Judas Priest, a idade não passa de um posto... E se perguntarem a algum fã de música - um verdadeiro fã de música - a resposta será, sempre, "depende".

Não existiam à partida quaisquer expectativas em relação ao concerto de Ozzy Osbourne em Lisboa, que fez parte daquela que está a ser vendida como a sua última digressão de sempre (e, como bem sabemos, isto hoje em dia não quer dizer porra nenhuma; o dinheiro fala sempre mais alto). Os Black Sabbath já lá vão, a sua carreira a solo nunca teve metade do interesse da banda e aquela voz já não é o que era. Sobraram por isso os êxitos, entoados por uma Altice Arena que não encheu: "Mr. Crowley" (que, a julgar pela quantidade de t-shirts dos Moonspell que se vislumbravam, foi dado a conhecer a muitos através da versão presente em algumas edições de Darkness And Hope), "Crazy Train", "Shot In The Dark" e "No More Tears" foram alguns deles. E ainda houve espaço para os Sabbath de "Fairies Wear Boots", "War Pigs" ou "Paranoid", esta última já no encore.

Sob o jugo de uma cruz gigantesca em palco, o Príncipe Das Trevas™ fez-se rodear de músicos exímios, entre os quais Zakk Wylde, que cumpriu todos os clichés rock: lançou-se um par de vezes para o meio do público, tocou com a guitarra atrás das costas e com recurso aos dentes, e arrancou solos intermináveis que fariam sentido no Gouveia Art Rock mas talvez não ali (um fã dizia, numa pausa para o seu cigarro, que tinha vindo «para ver o Ozzy e não para ver solos»). No início, pediu aos presentes para que fossem «loucos», e estes responderam apenas com gritos e palmas ao longo de hora e meia - nada de mosh ou crowdsurf, que a ciática é um problema muito sério. Acima de tudo, Ozzy cumpriu aquilo que se lhe pedia: não se engasgou (excepto quando falava ao público; alguém devia criar um tradutor para aquilo), não foi vergonhoso, não aterrou redondo em palco e nem sequer mordeu a cabeça a nenhum morcego para que os militantes do PAN não se chateassem. Com a idade dele, talvez continue a ser aceitável estar ali - rock will never die, não é?

Antes disso, foi dos Judas Priest o grande espectáculo da noite, tanto a nível musical como visual: chamas sempiternas nos ecrãs, uma mota em palco, cabedal a rodos nos corpos de poses exageradas e nos riffs, e uma bateria monstruosa, sem dúvida a grande mais-valia da veterana banda britânica, que no início da carreira até foi sacar um guitarrista aos Earth, grupo pré-Black Sabbath. Quem acha que não, deveria ser obrigado a escutar "Painkiller" em loop até começar a sangrar dos ouvidos e a falar em ritmo. A ferocidade desta metralhadora ficou bem patente em temas como este e "Firepower", que dá nome ao seu novo álbum, puro metal pesado escorrendo pelas paredes da Altice Arena. No balcão, há quem curta tanto que se dedica a fazer não air guitar mas sim air todos-os-instrumentos... E houve ainda espaço para um momento bonito - a entrada do guitarrista Glenn Tipton, praticamente forçado a deixar a profissão após ser diagnosticado com a Doença de Parkinson, para tocar apenas dois temas tecnicamente mais fáceis no encore: "Metal Gods" e "Breaking The Law". Isto sim, foi um espectáculo.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
05/07/2018