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Angel Olsen
Trienal de Arquitectura, Lisboa
08-/09/2015


Há muito que a vinda de Angel Olsen a Lisboa estava esgotada, e com mérito. Burn Your Fire For No Witness é daqueles discos que nos marcam a sério, um retrato do amor e da dor com o qual é muito, muito fácil identificarmo-nos, onde a tensão na sua voz prende-se-nos à pele, onde a folk é reinventada pela mão do grunge - uma criança dos nineties, Olsen, tal como nós éramos crianças dos nineties. Recebemo-la de braços abertos na Trienal de Arquitectura, num jardim que lembra uma Coura urbana, de rabo dormente sentado no chão, prestes a absorver cada uma das suas palavras. Que começam por ser:

© Vera Marmelo 

Oh my God, I need you close
Took me enough time to know
And after all the things we've seen
Together, I can't let go


© Vera Marmelo

...retiradas a "Free", uma das canções que compõem o disco anterior, Half Way Home. E apesar disto, Olsen não é uma menina amargurada: sorri, faz imensas piadas, diverte-se com o público e este com ela; ninguém diria que alguém capaz de traduzir tão bem a tristeza fosse tão jovial na sua forma de estar em palco. Admite humildemente um suposto plágio antes de "Drunk And With Dreams" (de Strange Cacti, EP de 2010), permite à banda que a acompanha um pequeno delírio space rock em "Sweet Dreams", e a dada altura sai-se com a tirada filosófica da noite, após elogiar em tom de crítica (ou seria o inverso?) o silêncio do público: If you live for the bus, get on the fucking bus!

© Vera Marmelo

Público esse que gritaria finalmente quando Olsen arranca para "Lights Out", e que se acomodaria bem perto do palco, mandando finalmente a dormência dos rabos às urtigas, aquando do rock sujo e acelerado de "High And Wild" e "Forgiven/Forgotten". Por esta altura já nos encontrávamos de corações ao alto, mas ninguém poderia supor que esses mesmos se elevariam ao nível de estrelas no momento em que a banda a abandona e Olsen ali fica, solitária, para interpretações de "Iota" e da magnífica "White Fire", com dezenas de pessoas absortas em cada qual dos seus sussurros. Uma enorme carta de amor sem destino, que poderia ser nossa, dela, do mundo inteiro, e que um final arockalhado só aperfeiçoou. O encore, com "Miranda", foi só a cereja no topo do bolo. Angel Olsen é de facto um tesouro; não haverá certamente ninguém que dali tenha saído mais pobre.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
09/09/2015